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Cinema

Dolittle | Colonoscopia para família toda e muito CGI

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Dolittle estreia nos cinemas brasileiros.

É preciso dizer que, assim que o filme abre, vemos uma linda introdução feita por animação, narrando sobre a fama do Doutor Dolittle. Como conseguiu sua casa e o terreno para cuidar dos animais, a perda de sua amada… Tudo em um tom de conto de fadas bem feito, quase nos fazendo duvidar das notícias sobre a produção desastrosa que foi esse filme.

Em seguida, o filme passa para o live-action. Dr. Dolittle (Robert Downey Jr.) desperta, e seus animais o vestem como em Cinderela. Ou seja, pássaros e ratinhos colocando nele um roupão. Daí em diante a dúvida sobre os problemas que cercam o filme desaparece e dá lugar à certeza. Remontado e reescrito muitas vezes, o filme não agradou a Universal Pictures em seu primeiro corte, por falta de tom familiar, falta de humor e falta de efeitos especiais. A partir disso, o projeto virou um empurra-empurra de ideias e datas de estreia, que foi de maio de 2019 para abril de 2019 e depois janeiro de 2020.

O  mês de janeiro é conhecido por ser um momento onde estúdios lançam filmes que acreditam que podem ir mal na bilheteria. Aparentemente, é o caso de Dolittle, que até o momento em que este texto foi escrito ainda não conseguiu se pagar (o filme custou 175 milhões de dólares, não contando sua publicidade).

Todo mundo ocupado

O diretor do projeto é Stephen Gaghan, que dirigiu Syriana (2005) e é um dos roteiristas de Traffic (2000). Tudo a ver com um filme para crianças, certo? Depois que foi decidido que muita coisa do filme seria refeita, chamaram Seth Rogen para ajudar no elemento cômico do filme. Todavia, Seth estava ocupado. Então chamaram Chris Mckay (diretor de Lego Batman: O filme), que, por sua vez, também não pode ajudar. Por fim, parou nas mãos de Jonathan Liebesman (lembra de As tartarugas ninja, de 2014? Então…).

Com Liebesman, o próprio Downey Jr. dando seus pitacos de produtor, e um diretor inexperiente no mundo do audiovisual infantil, parecia um excelente motivo para Universal gastar mais dinheiro com filmagens e refilmagens, além de usar qualquer desculpa pra lotar cada frame do máximo de CGI possível. Mas nem tudo são flowers na máquina de gastar dinheiro que é Hollywood.

O filme narra a viagem de Dolittle, esse já conhecido médico que consegue se comunicar com animais, para a Ilha do Éden (inclusive, o título do filme antes de todas as suas modificações era a A viagem do Doutor Dolittle). Lá ele precisa buscar um fruto da árvore do bem e do mal (sim, pois é), trazer de volta para a Inglaterra e salvar a vida da Rainha (Jessie Buckley), pois esse fruto é o único antídoto para o veneno que a Rainha consumiu.

Mistério da Rainha

O mistério de quem envenenou a Rainha e o porquê disso são previsíveis e o expectador resolve antes que o filme o faça. A tal viagem não possui um episódio interessante ou memorável, de fato. Soma-se a isso o fato de que o filme tem um elenco que a Universal mais uma vez não teve medo de gastar seus dólares, e com exceção talvez de Antonio Banderas, que faz um dos vilões, ninguém está atuando bem. Robert Downey Jr., que além de parecer que dubla a si mesmo em uma versão ASMR o filme inteiro, não fazia nada fora do Universo Marvel há seis anos e deve estar desacostumado a ser outros personagens.

Alguns animais também tem um desempenho de atuação ruim através de seus dubladores. Alguns deles são dublados por atores como Selena Gomez, Rami Malek, Emma Thompson, Octavia Spencer, Ralph Fiennes, Tom Holland, Marion Cortillard, Craig Robinson e até mesmo John Cena.

Dollittle, leia a crítica.
Robert Downey Jr. se esforça (divulgação: Universal Pictures)

Animais fofos e perdidos

Embora os animais sejam fofos, e ora bem feitos ora parece que feitos de borracha, muitos deles o carisma some quando o ator abre a boca, ou o carisma some mesmo por falta de espaço no filme, que é o caso do Tom Holland e seu cachorro cientista que usa óculos (que excetuando o momento que ele ajuda a perceber que a Rainha foi envenenada, o personagem passa a fazer apenas pontas dentro do filme).

Aliás, se havia outros planos para esse personagem do cão cientista e sua inteligência fora do comum ficaremos, possivelmente, um tempo sem saber. O roteiro, que por sua natureza tem cara de que foi remexido à exaustão, é inflado de momentos estapafúrdios e cômicos que raramente provocam algum riso. Considerado que toda e qualquer situação no filme é interrompido por uma sucessão de umas quatro piadas, o ritmo que já não estava bom fica ainda pior.

Passagens e peidos

Além disso, há diversas passagens do filme que fica muito claro que foi retrabalhada na sala de montagem e que há muito material jogado no lixo. Por exemplo, a cena onde Dolittle invade o castelo do rei Rassouli (Antonio Banderas), fica evidente que há diversos momentos, tanto da escalada da torre do castelo quanto da chegada até o castelo, que perdemos de vista, mas que há um esforço da edição de costurar os fatos quebrados através de narração.

A direção do filme muitas vezes se encontra entre o piloto automático e o esforço mais que redobrado de tentar fazer um filme mágico para a família toda. Além dessa magia de mágica não ter nada, principalmente nas cenas forçadas do menino Tommy (Harry Collett) sorrindo para qualquer coisa que os animais façam, com uma música (de Danny Elfman) onipresente de fundo, esse esforço diversas vezes é em vão, pois o encanto de ser um filme para todos várias vezes é quebrado justamente pelas inúmeras piadas que o filme tem, que vão do extremo infantil, que possivelmente algumas crianças de quatro anos para baixo irão rir, como as inúmeras e incontroláveis piadas sobre sexo, acasalamento, bolas do saco, e peido.

Por falar em peido, é extremamente necessário comentar um momento crucial do fim do filme, pois é um momento que definitivamente será comentado por muitos anos, que já nasceu desastroso no melhor sentido. Um momento que não deixará o filme cair no total esquecimento e que pode até mesmo atiçar a curiosidade de algumas pessoas para verem o filme inteiro, mesmo sabendo o que as aguarda.

Se você não quiser nenhum SPOILER pare de ler agora mesmo. Ok? Ok.

Se você ainda está lendo o texto, você aceitou tomar spoiler e poderei comentar esse momento icônico. Ao chegar na Ilha do Éden, a árvore do fruto é guardada por um dragão. Sim, há dragões no universo de Dr. Dolittle.  O protagonista rapidamente aprende a se comunicar. Dolittle então percebe que o Dragão (na verdade uma… dragoa? Dragona? Enfim, dublada pela Frances de la Tour) está sentindo muitas dores, e se oferece para ajudar. Em troca o dragão não pode devorar ele e seus amigos, e, de quebra, ainda tem a possibilidade de conseguir pegar o fruto.

Pois muito bem, Dolittle rapidamente percebe que precisa intervir no ânus do dragão. Dessa forma, começa todo um processo de colonoscopia/enema, onde Dolittle e os animais tentam arrancar algo que está preso lá dentro. Contudo, são interrompidos por um peido horrendo do dragão que faz o cabelo e a pele da face de Dolittle balançarem. Um esquilo ao fundo comenta, em sofrimento, que o cheiro é tão ruim que consegue sentir até o gosto. De volta ao processo da colonoscopia, depois de muito esforço eles arrancam de dentro do reto do dragão uma… gaita de fole.

Uma cena para os anais do cinema

Esse momento instantaneamente entra para os anais do cinema. Inclusive, de acordo com um informante do The Hollywood Reporter, foi ideia do próprio Robert Downey Jr.. Por sua vez, o ator se recusa a comentar sobre o fato de ter pensado nessa cena. De qualquer modo, para um estúdio que remontou o filme tantas vezes, parece que essa ideia foi muito razoável.

A Universal Pictures, após nos entregar o inacreditável Cats, nos dá em pouquíssimo tempo outro desastre audiovisual que envolve muito CGI, bichos, erotismo fora do lugar e um ritmo difícil de aguentar. Que os deuses do cinema e do capitalismo nos protejam do que mais eles tramam contra nós.

Veja o trailer:

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Cinema

‘Névoa prateada’, de Sacha Polak, é filme para refletir | Crítica

O longa estreia no dia 18 de abril nos cinemas de Brasília e São Paulo.

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nevoa prateada

Névoa prateada é um filme arrebatador que, com certeza, não vai passar incólume. O longa propicia emoções intensas, sejam elas positivas ou negativas. Fato que muitos não irão gostar. Alguns podem considerá-lo extremo demais, pesado demais. Os espectadores acostumados a tratar o cinema somente como forma de entretenimento e diversão provavelmente não irão gostar, já que é um filme que propõe análise e questionamentos. E que retrata uma realidade comum em alguns lugares da Inglaterra – e também de outros locais. Contudo, para quem gosta de assistir filmes que criticam a sociedade e comportamentos é um prato cheio. E para quem pretende aprender com o audiovisual também.

Mas sobre o que fala Névoa prateada?

A protagonista do filme é Franky, uma enfermeira de 23 anos que vive com a família em um bairro no leste de Londres. Obcecada por vingança e com a necessidade de encontrar culpados por um acidente traumático ocorrido há 15 anos, ela é incapaz de se envolver em um relacionamento com alguma profundidade. Até que se apaixona por Florence, uma de suas pacientes. As duas fogem para o litoral, onde Florence mora com a família. Lá, Franky encontrará o refúgio emocional para lidar com as questões do passado.

A saber, a atriz Vicky Knight, intérprete de Franky, venceu o Prêmio do Júri do Teddy Award do Festival de Berlim. Além disso, o longa recebeu indicação de Melhor Filme no Panorama Audience Award e foi destaque na programação da 47ª Mostra Internacional de Cinema em São PauloParticipou, também, dos prêmios Dinard British Film Festival (vencedor como melhor filme), Tribeca Film Festival (indicado ao Best International Narrative Feature), FilmOut San Diego US, Sunny Bunny LGBTQIA+ Film Festival, entre outros.

Vicky Knight
A atriz Vicky Knight, protagonista do longa. Foto: Divulgação.

A diretora de Névoa prateada, Sacha Polak, costuma levar para filmes temas difíceis, que poderiam facilmente ser assunto de terapia. A necessidade de se sentir amada, preconceitos, dificuldade de esquecer uma situação, aceitação. No longa em questão, Sacha trata de vários assuntos, como autoaceitação e, também, dificuldade de perdoar. Porém, apesar de ter uma gama de temas, o filme não se torna cansativo ou confuso. Muito pelo contrário, o roteiro passa para o espectador muito bem todos os conflitos da protagonista.

Além disso, Franky não é apresentada de forma piegas ou clichê. Por ter sido vítima de um incêndio, a personagem tem marcas em sua pele que poderiam, em uma narrativa mais lugar comum, transformá-la em uma pessoa que se vitimiza ou que é vista como coitadinha o tempo todo pelos outros. Mas não é isso que Sacha quer passar para quem assiste. E, apesar de não ter uma vida fácil, é possível enxergar Franky para além de suas cicatrizes. Franky é uma personagem complexa, completa e muito bem desenvolvida, tanto pelo roteiro quanto por sua intérprete.

Talvez por já ter trabalhado com Sacha Polak anteriormente, Vicky Knight tem facilidade em transpor para a tela os conflitos internos de Franky sem deixá-la simples demais ou transformá-la em um mártir. Também ajuda ter passado por situações parecidas com as da personagem. O fato é que foi justo o prêmio Teddy Awards que Vicky recebeu, já que consegue trabalhar nos detalhes, algo que nem todo ator tem sucesso.

Fotografia

Apesar de ser um recurso bastante comum, não deixa de ser interessante ver o filme em cores mais frias, já que Franky não tem uma vida fácil e passa por conflitos internos durante todo o filme. Também é possível que tal característica seja por ter sido filmado na Inglaterra, onde não há mesmo muito sol. Todavia, fica claro que Sacha Polak – e também a fotografia de Tibor Dingelstad – quis expressar o interior de Vicky nas cores frias que vemos nas cenas.

Além disso, a escolha de planos abertos quando Vicky se encontra perdida em sua vida e planos mais fechados quando ela começa a se encontrar ajudam a contar a história da protagonista. E, também, de sua coadjuvante, Florence. Aliás, Esme Creed-Miles arrasa na interpretação da menina totalmente sem rumo e influenciável. Se há algo negativo nesse filme é que Florence poderia ter tido mais espaço. E também, talvez, poderia ter havido mais cenas de Franky e Alice. Vicky Knight e Angela Bruce têm uma química muito boa em tela e poderia ter sido mais explorada.

Angela e Vicky
Angela Bruce e Vicky Knight. Foto: Divulgação.

Para resumir, é um filme bastante introspectivo, bonito e reflexivo, que mostra, de forma original, o valor das pessoas que nos rodeiam. Névoa prateada estreia no dia 18 de abril nos cinemas de Brasília e São Paulo.

Por fim, fique com o trailer:

Ficha Técnica

NÉVOA PRATEADA (Silver Haze)

Holanda, Reino Unido | 2023 | 1h42min. | Drama

Direção e roteiro: Sacha Polak.

Elenco: Vicky Knight, Esme Creed-Miles, Archie Brigden, Angela Bruce, Brandon Bendell, Carrie Bunyan, Alfie Deegan, Sarah-Jane Dent.

Produção: Viking Films.

Distribuição: Bitelli Films.

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