Dirigido por Hatice A?k?n, The House With No Address é retrofuturismo sobre memórias proibidas e a fragilidade de uma sociedade que tenta apagar a dor
Quando pensamos em ficção científica, nossa mente costuma ir direto a filmes com alienígenas, robôs, dinossauros, monstros, viagens no tempo e outras situações grandiosas que exploram ao máximo as possibilidades da tecnologia e de universos alternativos. Porém, também existem obras em que a ficção científica atua em escala reduzida: basta uma pequena alteração na realidade para que toda a sociedade se transforme, às vezes de forma tão sutil quanto opressora. E, em certos casos, esse detalhe mínimo é suficiente para criar um universo mais angustiante do que muitas distopias declaradas.
The House With No Address se encaixa nesse segundo tipo de ficção. O mundo retratado é muito semelhante ao nosso, com uma estética retrofuturista marcada por cores vibrantes, especialmente vermelho e verde. Nessa sociedade, existe uma regra implacável: pessoas condenadas por crimes ligados aos sete pecados capitais estão sujeitas à lei do esquecimento. A punição não é o apagamento literal das memórias, como em Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças (2004, Michel Gondry), mas sim a destruição física de todas as fotos, registros, itens e lembranças visíveis dessas pessoas. As memórias permanecem intocadas em nosso cérebro, porém proibidas de serem evocadas.
O filme, idealizado por Hatice A?k?n, não explica detalhadamente como a sociedade chegou a esse ponto. A única justificativa apresentada é a de que, no passado, crimes hediondos eram cometidos por indivíduos que buscavam ser lembrados para sempre. Assim, para evitar novas atrocidades, instituiu-se a lei. O funcionamento histórico dessa norma não é aprofundado, pois o interesse de The House With No Address está na reflexão contemporânea que ela provoca.

Cena de The House With No Address- Divulgação Oficial
A narrativa acompanha Alper, um jovem promotor que se vê obrigado a esquecer completamente sua mãe. Conforme questiona a legitimidade dessa regra, o relacionamento com seu pai, Aygin, esfria, levando ambos a decidir no que realmente acreditam. Aos poucos, o espectador vai compreendendo o universo da história, que se revela em ritmo lento, com uma cadência e estranheza que remetem ao cinema da Greek Weird Wave, assim, a escolha estética e narrativa de The House With No Address pode afastar quem busca narrativas mais convencionais ou hollywoodianas.
O arco de Alper é o de um homem confiante na ordem vigente, que após vivenciar na própria pele o que impõe a outros, ele entra em crise e recorre a uma clínica de esquecimento, instituições que oferecem métodos oficiais (e por vezes ridículos) para ajudar os cidadãos a “superar” aquelas pessoas que são obrigadas a esquecer.
A força de The House With No Address está na reflexão silenciosa sobre memória e legado. Esses temas não são discutidos de forma direta, mas permeiam cada cena, principalmente em diálogos duros, como o de uma mulher que chora pelo bebê arrancado de seu ventre após a condenação do marido, ou de uma gêmea obrigada a esquecer o irmão que cresceu com.
Visualmente, a obra aposta em enquadramentos próximos e uma direção de arte retrofuturista que causa estranhamento deliberado. Não é um filme de compreensão imediata, funcionando como uma verdadeira aula de filosofia, afinal, na medida que a produção aborda como lidamos com a civilização, o luto e a dor, refletimos como optamos, muitas vezes, forçar o esquecimento ao invés de viver este luto e esta dor, uma estratégia que apenas adia a possibilidade de seguirmos em frente.

Cena de The House With No Address- Divulgação Oficial
The House With No Address faz parte da 2º edição do Festival Filmes Incríveis que será realizado no Reag Belas Artes, em SP. Entre os dias 31 de Julho e 14 de Agosto, o festival passará 15 filmes de diferentes países como França, Geórgia, Turquia, Vietnã, entre outros, além de um filme surpresa que somente receberá informações no dia da projeção.
As informações sobre o festival Filmes Incríveis podem ser encontradas no site oficial, com ingressos a venda a partir do dia 24 de Julho, sendo R$12 reais a meia entrada, e R$24 a inteira, além da possibilidade de se comprar um passaporte para aqueles que desejam assistir a todos os filmes deste promissor espetáculo audiovisual.
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