Dirigido por Luciano Zito, Nancy: Entre o Desejo e o Passado é coming of age frio e vagaroso, que se apoia mais na contemplação do que na jornada
Sua narrativa parece suspensa no tempo, observando mais do que evoluindo, e convidando o espectador a mergulhar em uma atmosfera de introspecção e inércia.
Em filmes como As Virgens Suicidas (1999) e Maria Antonieta (2006), Sofia Coppola construiu universos anacrônicos e minuciosamente pensados para suas personagens. Suas obras raramente apresentam grandes reviravoltas, preferindo permanecer em um estado de blaze, um torpor existencial que é menos sobre a ação e mais sobre o sentir. Ainda assim, Coppola transforma essa imobilidade em reflexão.
Em Nancy: Entre o Desejo e o Passado, Luciano Zito, parece confundir a quietude com a estagnação, e o que poderia ser uma experiência contemplativa se torna, por vezes, monótona e redundante, resultando em um filme que se repete dentro de si mesmo, diluindo o impacto de sua própria sensibilidade, que poderia ser melhor representado dentro de um curta-metragem.

Camila Peralta em cena de ‘Nancy: Entre o Desejo e o Passado’- Divulgação Festival do Rio
Lembrando em muitos aspectos a estrutura narrativa das obras de Coppola ou de Greta Gerwig, especialmente Lady Bird: A Hora de Voar (2018), o longa acompanha Nancy, uma jovem empregada doméstica que arruma camas e limpa casas na periferia de Buenos Aires, em uma existência monótona marcada pela solidão e pela repetição do cotidiano, com a chegada de Juan, um eletricista, Nancy se abre para uma nova rotina despertando em si o vislumbre de uma vida diferente.
A fotografia inicial, fria e cinzenta, espelha o estado interno da protagonista, como um corpo em suspensão, à espera de um sentido. No entanto, conforme o filme avança, Nancy não parece mudar. Ela atravessa dúvidas e reflexões comuns à juventude: o primeiro amor, o medo do futuro, a incerteza sobre si mesma, mas sem que essas experiências reverberem com força narrativa. O silêncio, elemento constante da mise-en-scène, transforma-se em uma presença quase opressiva, seja o som distante do mar, ou o eco da floresta, atuando como espelhos do universo interno de sua protagonista: vasto, melancólico e desabitado.
Esse silêncio, que em Coppola costuma traduzir a vulnerabilidade e a delicadeza das personagens, aqui se converte em vazio. Nancy não apresenta um arco emocional definido, apoiando-se no discurso já conhecido de: “como é difícil ser uma jovem mulher adulta”, sem oferecer um olhar novo sobre isso, além do contexto latino que o filme apresenta.
O frio argentino, cuidadosamente retratado pela direção de arte, encontra um reflexo direto na frieza emocional da protagonista. Há uma sensibilidade latente em seus quadros, mas também uma falta de pulsação, mesmo quando Nancy se torna mais ativa após conhecer Juan, o filme retorna à quietude, ao mesmo blaze entorpecido que nunca se desfaz.
O centro da obra está na solidão que envolve Nancy e na tentativa de encontrar calor em meio ao vazio. Sua busca por afeto e pertencimento é genuína, mas o filme a repete até o esgotamento, sem jamais mergulhar com profundidade em seus traumas, entregando uma experiência visualmente delicada, mas emocionalmente distante, uma narrativa que privilegia o belo em detrimento do vivo.

Camila Peralta em cena de ‘Nancy: Entre o Desejo e o Passado’- Divulgação Festival do Rio
Com duração de 75 minutos, Nancy: Entre o Desejo e o Passado tem belas imagens imaginadas por Luciano Zito, mas se prende a um ritmo contemplativo que enfraquece o impacto da história, terminando como a produção se iniciou: com uma jovem olhando para o mar, desejando nadar para longe, sem nunca conseguir sair do lugar. Um retrato melancólico de uma solidão que, embora verdadeira e empática, carece de movimento para tornar-se inesquecível.
O filme fez parte da Premiere Latina do 27º Festival do Rio.
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