Dirigido por Celine Song, Amores Materialistas é um irmão de Vidas Passadas, demonstrando com menos profundidade, mas, com veracidade, o que é amor na atualidade
No século XVI, William Shakespeare já escrevia comédias românticas que misturavam absurdos cômicos a dramas com finais felizes, como Sonho de Uma Noite de Verão e Muito Barulho por Nada (ambos de 1600). Quinhentos anos depois, ainda somos cativados por essas histórias de amor com humor e desencontros, desde clássicos do cinema, como Levada da Breca (1938, Howard Hawks) até depois do boom do sub-gênero ocorrido nas décadas de 80 e 90. Entretanto, nos anos 2000, entramos na era da “pós comédia romântica”, onde a fórmula começa a ser subvertida e revista sob novos olhares, como em Amores Materialistas.
Irmão temático de Vidas Passadas (2023, Celine Song), Amores Materialistas também investiga o amor em tempos modernos, mas agora com um olhar mais direto sobre suas complexidades sociais. O filme acompanha um triângulo amoroso entre Lucy, Dakota Johnson, uma casamenteira pragmática; Harry, Pedro Pascal, o par perfeito; e John, Chris Evans, o ex-namorado imperfeito. Apesar de seguir fórmulas conhecidas de comédias românticas como O Diário de Bridget Jones (2001), o filme oferece reflexões sobre como o amor foi engolido por um mundo que prioriza o tangível, o matemático e o idealizado.
A escolha do elenco é estratégica: o carisma dos protagonistas e o apelo midiático da campanha “#TimePedro ou #TimeChris”, incentivado pela Sony Pictures, impulsionam o envolvimento do público. Mas o interesse vai além da escolha de “com quem ela deve ficar”, afinal, Song propõe uma leitura crítica da forma como nos relacionamos hoje, sempre cercados de opções, exigências e algoritmos, deixando de ver a beleza nas imperfeições e na simplicidade dos afetos reais, em pró de algo que não existe. Quem ficará com Dakota ou não pode ser divertido para o público, porém, não é o objetivo primário da produção.

Dakota Johnson e Chris Evans em cena de Amores Materialistas- Copyright Jose Perez/Bauer-Griffin
Dois momentos encapsulam bem a proposta do filme. O primeiro é o prólogo ambientado na Idade da Pedra, onde o amor, apesar de já condicionado pelas necessidades materiais, era mais direto e menos contaminado por expectativas e ilusões. O segundo está na figura de Sophie, cliente de Lucy, uma mulher bem-sucedida e agradável, mas que, por não ser “excepcional” o suficiente, é descartada em um mercado amoroso competitivo e idealizado, que parece moer tudo em seu caminho.
Apesar de ser casamenteira, Lucy representa esse espírito moderno: vê o amor como uma equação, reduzindo sentimentos a uma lógica de mercado. Isso incomoda a audiência, não por ser uma falha do roteiro, mas por refletir a realidade de aplicativos como Bumble e Tinder, onde encontros se desfazem em minutos por falta de encaixe imediato em cima de uma idealização pessoal.
Com uma mise-en-scène refinada e decupagem cuidadosa, Amores Materialistas capta bem os conflitos internos de seus personagens, ao mesmo tempo em que valoriza a paisagem urbana de Nova Iorque, porém, a produção não é tão profunda quanto Vidas Passadas, nem tão encantadora quanto Um Lugar Chamado Notting Hill (1999), mas encontra seu espaço ao ficar no limiar entre o retrato da vida real e tons leves da comédia romântica, trazendo um otimismo muito bem aceito nos dias de hoje.
Dakota Johnson em cena de Amores Materialistas- Divulgação Collider
Ao fim, Amores Materialistas parece mais interessado em provocar questionamentos do que entregar soluções. Celine Song retoma temas de sua obra anterior para nos lembrar que talvez estejamos complicando algo que deveria ser simples. E mesmo que amar hoje pareça um ato difícil, ainda vale a pena, nem que seja para aprender uma coisa ou outra sobre nós pelo caminho.
Com distribuição da Sony Pictures, Amores Materialistas estreia nos cinemas no dia 31 de Julho.
Siga-nos e confira outras dicas em @viventeandante e no nosso canal de whatsapp !



