Autor: Rômulo Barreto Jr, Doutor em Direito pela Universidade de Santiago de Compostela (Espanha) e advogado
Na última década, diversos estudos científicos sobre mediação comunitária foram publicados ao redor do mundo, com ênfase em países como Brasil, China, Estados Unidos e Sri Lanka (Valters, 2013)[1]. A maioria dessas pesquisas adota uma abordagem local, voltada para a resolução de conflitos em comunidades socialmente vulneráveis e com desafios sociais significativos.
É no contexto da interculturalidade que se debate as novas formas de justiça emergente, em que as comunidades étnicas, os grupos ou classes sociais se reconhecem em suas diferenças e buscam consensos.
O conceito de mediação intercultural passa por ser um processo de facilitação de comunicação e resolução de conflitos entre pessoas de diferentes culturas. Trata-se de um tipo de mediação que não apenas aborda conflitos específicos, mas também tem função educativa, aumentando a consciência sobre a diversidade cultural e promovendo o respeito mútuo.
Para além de auxiliar na construção do sentimento de pertença comum, a mediação pode ajudar a respeitar as identidades e as pertenças individuais e não partilhadas dos membros da comunidade local, quer sejam de proveniência de nacionalidade/território, etnia, religião, gênero ou políticas. A mediação intercultural surge como essencial na relação respeito e pluralismo na sociedade democrática e na sua cidadania diversificada (Giménez, 2020)[2].
Sua eficácia é constatada em indivíduos com dificuldades de socialização, neste aspecto tem-se o exemplo dos imigrantes que por diversos motivos encontram barreiras de comunicação, as quais dificultam o acesso universal aos direitos fundamentais e a sua integração junto à comunidade local (Barreto Jr, 2020)[3].
Seja pela situação de ilegalidade, seja pela dificuldade de compreender o idioma local ou até mesmo em interpretar as normas vigentes do local de acolhimento; para o imigrante, a mediação comunitária representa uma oportunidade de capacitação para lidar com situações de eventual conflito, de forma a prevenir e antecipar o curso dos acontecimentos.
Sendo para tal fundamental o direito a aprender e a ensinar, ou seja, adquirir conhecimento científico e competências interculturais que possibilitem a construção de diálogos transformadores nas comunidades locais, regionais, nacionais e internacionais de que fazem parte a fim de resolverem conflitos.
Neste contexto, surge uma renovada aposta na mediação intercultural em Portugal, reconhecendo a importância dessa prática para a integração de alunos estrangeiros. Em janeiro de 2025, o Ministério da Educação, Ciência e Inovação – MECI[4] anunciou a contratação direta de 287 mediadores interculturais por 319 escolas, facilitando a adaptação e o sucesso escolar desses estudantes.
Assim, na contramão de um mundo cada vez mais fechado ao diálogo, acredito que vale a pena apostar na mediação intercultural como uma ferramenta essencial para construir uma sociedade mais inclusiva. Alinhar as políticas públicas aos desafios da diversidade não só promove a integração, mas também fortalece a educação como um caminho para um futuro mais justo e solidário para todos.
[1] Valters, C. (2013). Community Mediation and Social Harmony in Sri Lanka. Justice and Security Research Programme. London School of Economics and Political Science. http://eprints.lse.ac.uk/id/eprint/56356
[2] Giménez, C. (2020). La mediación y las metodologías participativas de resolución de conflictos como vía para el fortalecimiento da la democracia. Anuario CEIPAZ, (12), 127-144. https://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=7802969
[3] Barreto Jr, R. (2020). Mediação Intercultural: Instrumento de Acesso aos Direitos Fundamentais – Projeto De Mediadores Municipais e Interculturais. In: Silva, E. G., Brito, P., Veiga, F. S., Gonçalves, R. M (Orgs.). Análise crítica do direito Ibero-americano. pp. 162-169. https://dialnet.unirioja.es/servlet/articulo?codigo=7469315
[4] Despacho n.º 656/2025, de 15 de janeiro. Fonte: https://diariodarepublica.pt/dr/detalhe/despacho/656-2025-903592200 (consultado em 30-01-2025)
Este artigo pertence a coluna Ciência editada por Matheus Belucio.