Uma nova pesquisa acaba de revelar o tamanho e a força do consumo negro no Brasil, ao mesmo tempo em que denuncia as barreiras ainda existentes. Intitulado O Consumo Invisível da Maioria: percepções, gatilhos e barreiras de consumo da população negra no Brasil, o estudo do Instituto Akatu e do Instituto DataRaça, com execução da Market Analysis, foi apresentado durante o Fórum Brasil Diverso 2025, no Memorial da América Latina, em São Paulo.
O levantamento mostra que 1 em cada 3 pessoas negras (34,8%) sofreu discriminação ao tentar acessar produtos ou serviços no último ano, mas também aponta para um público protagonista, engajado e economicamente relevante: a população negra movimenta cerca de R$ 1,9 trilhão por ano, segundo estimativas do Movimento Black Money.
Mais do que um diagnóstico social, a pesquisa é um mapa de oportunidades de negócios e reputação. Foram ouvidas 1.000 pessoas negras em todas as regiões do país, com amostra ponderada por gênero, idade, classe social e região. A margem de erro é de 3,1 pontos percentuais e o nível de confiança de 95%.
O resultado do estudo O Consumo Invisível da Maioria: percepções, gatilhos e barreiras de consumo da população negra no Brasil mostra um consumidor ativo, criterioso e com postura crítica diante das marcas.

Cerca de 37,4% já premiaram empresas que respeitam a população negra, enquanto 24,6% boicotaram aquelas com atitudes racistas. O engajamento é ainda maior entre jovens e mulheres negras, com destaque para a geração Z (18 a 24 anos), que demonstra clara consciência racial e disposição para agir de forma coerente com seus valores. Segundo o estudo, 73,9% dos jovens percebem discriminação no consumo, mas 45,5% recompensam marcas inclusivas.
Regionalmente, o levantamento revela que o Nordeste é o epicentro do engajamento digital e do ativismo de consumo, com 67,4% dos entrevistados usando as redes sociais para discutir inclusão racial. O Sudeste apresenta alto índice de confiança no YouTube (72,5%), enquanto o Centro-Oeste se destaca pelo uso do WhatsApp (49,5%) como canal de debate e mobilização. Já o Sul registra as maiores percepções de barreira racial, contrastando com o otimismo do Nordeste quanto ao papel transformador das marcas. Esses dados revelam que a inclusão não é apenas uma questão moral, mas uma estratégia de mercado e competitividade.
“Onde a população negra se sente reconhecida, há mais lealdade e disposição para consumo. A inclusão é a nova alavanca de prosperidade compartilhada”, afirma Lucio Vicente, diretor do Instituto Akatu.
A pesquisa ainda identifica os setores mais bem avaliados em inclusão racial, e-commerce, higiene e beleza, moda e bancos, com mais de 70% de aprovação. Já bebidas, alimentos e medicamentos aparecem como os mais distantes da diversidade, abrindo espaço para reposicionamento e inovação. Nos segmentos presenciais, como varejo e supermercados, estão os maiores desafios e oportunidades: a implementação de treinamentos antirracistas, protocolos de acolhimento e métricas de experiência inclusiva são vistos como diferenciais de confiança e fidelização.

O estudo também introduz dois indicadores inéditos: o Índice de Barreiras à Inclusão Racial no Consumo (IBIRC), de 59,5 pontos, e o Índice de Etnocentrismo Racial (IERC), de 36,5 pontos, que funcionam como ferramentas estratégicas para mensurar a evolução da inclusão corporativa.
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A representatividade autêntica desponta como um dos pilares centrais da reputação de marca. Para 64% dos entrevistados, ver pessoas negras retratadas de forma positiva aumenta a confiança na empresa, enquanto 69% afirmam perder credibilidade quando não há lideranças negras em cargos de visibilidade. O público também demonstra rejeição a campanhas superficiais: o uso indevido de referências culturais negras foi apontado como principal erro (18%).
Na contramão, o consumo negro no mercado de luxo e lifestyle premium se mostra promissor: 28% dos consumidores negros pertencem às classes A e B, com disposição para investir em marcas que traduzam respeito e autenticidade.
“As empresas que enxergarem diversidade como sofisticação e prestígio contemporâneo vão se destacar globalmente”, avalia Maurício Pestana, presidente do Instituto DataRaça.
Outro ponto essencial do estudo é o nível de confiança institucional.
Para 85,3% dos consumidores negros, as empresas são mais confiáveis do que o governo no tema da inclusão racial, mas apenas 17% confiam plenamente nas corporações, ou seja, uma confiança “vigiada”. As ONGs e movimentos sociais são percebidos como os agentes mais legítimos de transformação, e 73% das mulheres negras e 54% dos jovens afirmam confiar mais em influenciadores e coletivos do que em campanhas tradicionais. Essa nova dinâmica mostra que a população negra não espera que governos ou empresas ditem mudanças, mas exige protagonismo e coerência de todos os agentes sociais.

O consumo negro, portanto, ultrapassa o aspecto econômico e se torna um ato político e de pertencimento. O que antes era invisível agora assume centralidade: a maioria negra do país exige respeito, representação e voz. À medida que esse público ocupa o centro das decisões de compra e influência, as marcas passam a ser avaliadas não apenas por seus produtos, mas por seus valores e ações.
A mensagem é clara: inclusão é sinônimo de credibilidade e vantagem competitiva sustentável. O estudo conclui que empresas que praticam diversidade de forma concreta, com lideranças negras e narrativas consistentes, colhem ganhos de reputação e fidelidade, enquanto aquelas que permanecem neutras perdem espaço em um mercado cada vez mais consciente.
Versão pública: disponível em akatu.org.br/pesquisas-e-publicacoes
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