Dirigido por Tarik Saleh, Águias da República, é retrato contundente da violência da ditadura e da impotência do homem comum diante de um regime autoritário
Há diversas semelhanças entre Yes (2025, Navad Lapid) e Águias da República, sendo a principal o retrato da ditadura e da militância que assola o país. Ambos são filmes densos e difíceis de digerir, que apresentam uma primeira parte divertida para, em seguida, convidar o espectador a refletir sobre o motivo de suas próprias risadas. No entanto, enquanto a produção de Lapid se apoia numa ironia constante, Saleh opta por uma crítica mais direta, sem recorrer a sarcasmos ou subtextos, seu retrato da realidade é explícito e sem disfarces, e por conta disso sofre as consequências.
Águias da República se apresenta como um thriller político centrado em George Fahmy, um ator egípcio adorado pelo público. Após sofrer ameaças do regime ditatorial que domina o país, George é forçado a aceitar um papel comprometedor: interpretar o presidente Abdel Fattah el-Sisi, em uma produção que visa glorificar o governo. Envolvido no círculo íntimo do poder, ele inicia um caso com a esposa do ministro da Defesa e se afunda em seus próprios princípios frágeis, enquanto suas decisões começam a afetar todos ao seu redor: o filho, a ex-mulher, a namorada e os amigos.

Fares Fares em cena de “Águias da República”- Divulgação Imovision
O carismático George não tem escolha senão ceder, arrastando consigo todos que ama para o coração do regime. O que parecia apenas mais um trabalho se transforma em uma bomba de pavio lento, cuja explosão só ocorre no terceiro ato, em um momento que talvez já seja tarde demais.
Águias da República é rodeado por uma atmosfera que mistura a indústria do entretenimento com o autoritarismo estatal, se utilizando de uma tonalidade de cor voltada para o beje e o marrom, para revelar como o governo utiliza a arte como ferramenta de autopromoção. Este paralelo é um dos aspectos mais interessantes do roteiro, embora seja inevitável pensar que o humor ácido de Lapid poderia ter enriquecido algumas situações absurdas, como a briga de George com os colegas de elenco enquanto critica o próprio roteiro do filme que é obrigado a protagonizar.
Águias da República brilha no primeiro ato e entrega um clímax poderoso no final, mas tropeça em um segundo ato moroso, onde o ritmo se perde em discussões políticas e olhares de intimidação, transmitindo bem o desconforto dos personagens, mas deixando a narrativa estagnada, com poucas cenas que realmente transformam seus protagonistas. Ao final, o resultado são vácuos narrativos em um filme que tinha potencial para ser uma sátira contundente, especialmente nas sequências que exploram a censura estatal e os bastidores da produção dentro do filme.
A censura, representada por Dr. Manssour e seu bigode intimidador, é um dos pontos altos. Suas interações com George estão entre os melhores momentos, assim como as cenas com as mulheres do protagonista, em especial Donya, interpretada por uma excelente e subaproveitada Lyna Khoudri, em uma personagem poderia ter tido a mesma força e complexidade de Naomi Lapaglia de O Lobo de Wall Street (2013, Martin Scorsese), mas acaba reduzida ao papel previsível da jovem amante traída.

Pôster Oficial de “Águias da República”- Divulgação Oficial
Em sua construção de morno thriller político, Tarik Saleh provoca desconforto, em especial no explosivo desfecho, mas o roteiro e a direção carecem de ousadia. O que poderia ser um estudo criativo sobre poder e arte sob repressão acaba se tornando um exercício de desconforto pelo desconforto, sem alcançar o potencial de reflexão ou inovação que o tema exigia, resultando em um filme que pede coragem, mas se contenta em ser apenas perturbador.
Assistido durante a 49º Mostra Internacional de Cinema de SP, Águias da República é uma distribuição Imovision e atualmente é o Pré Indicado Sueco para o Oscar 2026.
Siga-nos e confira outras dicas em @viventeandante e no nosso canal de whatsapp !



