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Cinema

Crítica – Dor e Glória traz Almodóvar autobiográfico, belo e profundo

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O Salvador está submerso. A vida não fluiu como esperava. Vemos uma grande cicatriz em suas costas, uma marca das dores. Debaixo d’água, recria o passado: uma lindíssima cena de sua mãe e as vizinhas lavando roupa na beira do rio enquanto cantam. Poesia.

É isso, Almodóvar nos brinda mais uma vez com poesia em forma de cinema. Ou cinema em forma de poesia?

Um melodrama bom de assistir, contando a história do pequeno Salvador Mallo, que vai de solista do coral da escola até roteirista e diretor de cinema.

Cheio de dores e doenças, físicas e psicológicas, um quadro depressivo, aquela melancolia pesada como companhia. No dia em que sente uma só dor, é ateu; porém, quando tem várias ao mesmo tempo, acredita e pede forças a Deus. A velhice é dolorosa e inevitável, insiste em chegar. Como lidar com isso?

Antonio Banderas faz um Salvador perdido, com olhar triste, pesaroso. Somos presenteados com uma bela atuação, assim como a de Penélope Cruz fazendo Jacinta, uma mulher firme e forte, dona de casa cuidando do filho, em um esforço contínuo para que progrida.

Enquanto isso, no peito do protagonista o passado ressurge cada vez mais. A vida na “cueva” em um vilarejo da Espanha, o fascínio do primeiro desejo, explicitado tanto em pequenos detalhes – como quando o pequenino vira professor – como em uma cena erótica e sublime, onde uma vez mais a simbologia da água está presente.

Almodóvar cria um drama autobiográfico de grande beleza. O longa é cheio de sentimento, sensibilidade e profundidade, com bons diálogos e estilo. Fala muito sobre amor, drogas, vícios, desejos. O complexo de Édipo está aqui, a sempre complicada relação entre mãe (Julieta Serrano, clássica) e filho. Entre eles, temos diálogos tocantes, carregados de carinho e mágoas.

Asier Etxeandia, com muita competência e coração, é Alberto Crespo, ator decadente, entregue ao dragão da heroína. Dragão este que acaba sendo descoberto por Salvador como um remédio para suas dores, contudo, as descobertas tardias são fortes como coice de cavalo. Diretor e ator tem uma briga antiga que vem à tona. Contudo, podem agora ter uma segunda chance e servirem um ao outro para emergirem novamente.

No teatro, o monólogo de Alberto traz emoções e revelações aos espectadores. Leonardo Sbaraglia atua como o amoroso Federico, velha paixão e fonte inspiradora para o pensamento que o amor pode mover montanhas, mas não basta para salvar quem você ama.

Enquanto os tons de vermelho se sobressaem, a metalinguagem é, ao mesmo tempo, sutil e gritante. O cinema, a sétima arte, é muito; transcendência, expressão, e é, acima de tudo, a salvação de Salvador, ou, melhor: redenção.

Sem dúvidas é um dos melhores filmes desse grande cineasta. Pleno de honestidade e coerência com sua criatividade e capacidade narrativa emocionante e comovente. Há uma sofisticada sobreposição escondida à vista de todos, uma tomada em especial que é uma conclusão preciosa, emocional e otimista da penitência de Salvador, e também um repensar de tudo que assistimos.

Quando na tela vem aparecendo a última cena, o plano abrindo, surgiu uma única frase na minha mente, que desceu e saiu como um sussurro pela minha boca semiaberta: “Que maravilha”.

Jornalista Cultural. Um ser vivente nesse mundo cheio de mundos. Um realista esperançoso e divulgador da cultura como elemento de elevação na evolução.

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Nenhum saber para trás: os perigos das epistemologias únicas, com Cida Bento e Daniel Munduruku | Assista aqui

Veja o filme que aborda ações afirmativas e o racismo na ciência num diálogo contundente

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Nenhum saber para trás: os perigos das epistemologias únicas | com Cida Bento e Daniel Munduruku

Na última quinta-feira (23), fomos convidados para o evento de lançamento do curta-metragem Nenhum saber para trás: os perigos das epistemologias únicas | com Cida Bento e Daniel Munduruku. Aconteceu no Museu da República, no Rio de Janeiro.

Após a exibição um relevante debate ocorreu. Com mediação de Thales Vieira, estiveram presentes Raika Moisés, gestora de divulgação científica do Instituto Serrapilheira; Luiz Augusto Campos, professor de Sociologia da UERJ e Carol Canegal, coordenadora de pesquisas no Observatório da Branquitude. Ynaê Lopes dos Santos e outros que estavam na plateia também acrescentaram reflexões sobre epistemicídio.

Futura série?

O filme é belo e necessário e mereceria virar uma série. A direção de Fábio Gregório é sensível, cria uma aura de terror, utilizando o cenário, e ao mesmo tempo de força, pelos personagens que se encontram e são iluminados como verdadeiros baluartes de um saber ancestral. Além disso, a direção de fotografia de Yago Nauan favorece a imponência daqueles sábios.

O roteiro de Aline Vieira, com argumento de Thales Vieira, é o fio condutor para os protagonistas brilharem. Cida Bento e Daniel Munduruku, uma mulher negra e um homem indígena, dialogam sobre o não-pertencimento naquele lugar, o prédio da São Francisco, Faculdade de Direito da USP. Um lugar opressor para negros, pobres e indígenas.

Jacinta

As falas de ambos são cheias de sabedoria e realidade, e é tudo verdade. Jacinta Maria de Santana, mulher negra que teve seu corpo embalsamado, exposto como curiosidade científica e usado em trotes estudantis no Largo São Francisco, é um dos exemplos citados. Obra de Amâncio de Carvalho, responsável por colocar o corpo ali e que é nome de rua e de uma sala na USP.

Aliás, esse filme vem de uma nova geração de conteúdo audiovisual voltado para um combate antirracista. É o tipo de trabalho para ser mostrado em escolas, como, por exemplo, o filme Rio, Negro.

Por fim, a parceria entre Alma Preta e o Observatório da Branquitude resultaram em uma obra pontual para o entendimento e a mudança da cultura brasileira.

Em seguida, assista Nenhum saber para trás:

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