Olhar uma personalidade icônica pelas lentes do cinema não é tarefa das mais fáceis. Há sempre o risco da obra cair nos clichês, lugares comuns ou simplesmente se ater há apenas um aspecto da vida do personagem exposto, reduzindo-o quase a uma caricatura. Contudo, não é o caso de “Othelo, o Grande”, documentário de Lucas H. Rossi dos Santos.
O filme consegue, com delicadeza e sensibilidade, passar por toda a vida de um dos maiores artistas brasileiros. O longa foge da fórmula batida dos documentários, onde depoimentos se alternam com imagens de arquivo e consegue construir um retrato afetivo da figura que pretende nos apresentar. Aqui é o próprio Grande Otelo, o homem negro, o ator, cantor, trabalhador das artes, que narra sua vida como autor de sua própria história – e através de sua vida também temos um panorama do Brasil e como suas estruturas injustas persistem ao longo dos anos.
Sem panfletos
Há espaço para momentos conturbados de sua trajetória, a dor e o sofrimento estão presentes, mas em nenhum momento cai no pieguismo ou sentimentalismo. O racismo perpassa toda a vida de Otelo, mas o filme não se torna uma obra panfletária: a arte fala mais alto e a vida do artista com todas as suas lutas para continuar existindo por si só é uma denuncia de que o Brasil daquele tempo (como o de hoje?) não estava preparado para aquele homem único.
Além disso, vale também um destaque para a montagem que confere uma dinâmica única e ao termino ficamos com aquele gosto de quero mais, e não há nada melhor para um filme do que sairmos da sessão ainda pensando no que vimos, como se aquilo mostrado na tela grande não se esgotasse por si só. “Othelo, o Grande” é um filme que merece e precisa ser visto por todos, em especial pelos negros, sejam artistas ou de qualquer outra profissão, pois muitas vezes se tem a sensação de estar só e e no inicio da caminhada. O homem Sebastião Bernardes de Souza Prata vem pra mostrar: “nossos passos vem de longe”.
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