Dirigido por Marcelo Gomes e Maria Clara Escobar, Dolores é importante obra que retrata a força e a complexidade da experiência feminina.
Baseado em uma história original de Chiquinho Teixeira, Dolores acompanha os sonhos e frustrações de três gerações de mulheres, Dolores, Deborah e Duda, onde cada uma, à sua maneira, buscam recuperar algo perdido: a dignidade, o tempo ou simplesmente um propósito de vida. Assim, ao longo de 84 minutos, seguimos suas trajetórias entre dramas pessoais, fracassos e desejos de libertação, em uma narrativa que por vezes soa como uma telenovela, alternando bons momentos com certa dispersão temática, e uma mensagem que mesmo sendo clara, é enfatizada a todo momento.
O foco central está em Dolores, a matriarca interpretada com intensidade por Carla Ribas, uma mulher que tem viciada em jogos, que tem o desejo de abrir um cassino no Brasil. Ao redor dela orbitam Deborah, a distante filha que tenta se reconstruir após o abandono do companheiro recém-saído da prisão, e Duda, a neta que sonha com uma carreira policial no exterior, enquanto enfrenta o machismo dentro da corporação.

Carla Ribas, Naruna Costa e Gilda Nomacce em cena de “Dolores”- Divulgação Festival do Rio
A direção de arte é um dos pontos altos da produção: as cores que cercam essas mulheres evoluem junto com elas, refletindo seus estados emocionais e o ganho de autoconfiança, juntamente com o design de som, que por sua vez, reforça o caráter onírico da narrativa, utilizando com leveza do som extracampo, e criando um interessante paralelo entre sonho e realidade que é único para cada uma de suas protagonistas, além presença de uma brilhante Gilda Nomacce como Marlene, adicionando força dramática e se destacando pela expressividade e pela entrega, algo clássico da atriz em um de seus papéis mais “normais”.
A fotografia é notável, com contrastes bem trabalhados entre luz e sombra e uma iluminação por vezes etérea, especialmente nas sequências de premonições de Dolores, porém, o roteiro se mostra irregular: ora sobrecarregado de intenções, ora raso em seu desenvolvimento, com cenas marcantes, como o mergulho de Deborah e Duda na piscina, ou a perda de dinheiro de Dolores no cassino, demonstram o potencial emocional de uma obra que carece de uma costura narrativa que as una organicamente.
Em seu desfecho, os arcos femininos iniciam de forma promissora, mas perdem força à medida que o filme avança. Dolores luta contra o vício e o isolamento, Deborah tenta redescobrir o próprio valor, e Duda questiona o papel da mulher dentro da polícia, entretanto, essas jornadas terminam sem a profundidade esperada, e o resultado é uma sensação de vazio, como se a obra se contentasse em celebrar o ato de sonhar, sem consolidar o que esses sonhos realmente representam.

Carla Ribas em cena de Dolores- Divulgação Festival do Rio
Durante o debate após a sessão, a produtora Sara Silveira destacou que “fazer cinema é um ato político”, e Dolores reafirma isso ao retratar mulheres em luta por autonomia e desejo, ainda assim, a produção se perde ao enfatizar em excesso a importância de sonhar, especialmente na maturidade, e não trabalhar o impacto da realização destes desejos tão presentes.
Participando da Competição Premiere Brasil do 27º Festival do Rio, Dolores é um filme de intenções nobres e visualmente marcante, se tornando um retrato sensível, ainda que inacabado, da força feminina diante da fragilidade dos sonhos.
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