Dirigido por Isaiah Saxon, A Lenda de Ochi é lindo em sua atmosfera de contos de fadas, porém, falha ao encontrar o seu público alvo
Em menos de um mês, será lançado no cinema 3 filmes com premissas semelhantes, dois remakes que certamente farão um bilhão de dólares: Lilo e Stitch (2025, Dean Fleischer Camp) e Como Treinar o Seu Dragão (2025, Dean DeBlois), e um lindo filme independente, distribuído nos EUA pela A24, que pode ser descrito, com precisão, como uma aventura de fantasia derivada de filmes dos anos 80 como História Sem Fim (1984, Wolfgang Petersen) e Caravana da Coragem (1984, John Korty), chamado A Lenda de Ochi.
A produção de Isaiah Saxon conta a história de Yuri, uma menina reclusa que cresceu aprendendo a temer uma criatura folclórica chamada Ochi, porém, ao se tornar amiga de um pequeno bebê Ochi, ela parte em uma longa jornada para devolve-lo à sua família.
Confira abaixo o trailer de A Lenda de Ochi e continue lendo a crítica
A Lenda de Ochi pode ser compreendido como um conto de fadas na medida que apresenta uma atmosfera lúdica e mágica, desde a narração inicial de Yuri, os seres fantásticos presentes na forma dos Ochis, as lições de bondade que são aprendidas na produção, entre outras questões presentes ao longo da narrativa, incluindo a floresta que é ao mesmo tempo grandiosa e aterrorizadora, porém, a produção apresenta dificuldades ao considerarmos que atualmente estas histórias são compreendidas ao público infantil, e A Lenda de Ochi não é adequada para este público.
Apesar de apresentar uma premissa semelhante à Lilo e Stitch, a construção de A Lenda de Ochi é muito mais madura, discutindo família, dor, isolamento, abandono e morte, de uma maneira que não dosa estes sentimentos, apesar de ter um bichinho fofo envolvido. A atmosfera do filme é sinistra, seja pela natureza que sempre é maior do que seus personagens, a fotografia super saturada que traz uma nostalgia aos filmes dos anos 80 e que não apresenta medo de mostrar a escuridão, ou a trilha grandiosa de David Longstreth, um dos pontos altos da produção, principalmente se levarmos em consideração a construção do Ochi.

Um Ochi de A Lenda de Ochi- Divulgação A24
Do mesmo modo que Stitch e Banguela, o Ochi não existe na vida real, nem sequer é baseado em uma história folclórica. Ele é fruto de muito trabalho e pesquisa da parte de Isaiah Saxon e toda a equipe, na medida que foi criada uma mitologia em cima da criatura, além de diversos estudos sobre seu dialeto, seu modo de locomoção, sua pelagem, entre outras questões.
Para trazer um Ochi à vida, ocorreu uma junção entre marionetes, animatrônicos e efeitos visuais, sendo controlado por 7 especialistas que traziam suavidade aos movimentos, semelhante ao que foi feito em outra história fantástica: O Labirinto. do Fauno (2006, Guillermo del Toro).
Por conta do animal ser uma criatura mitológica criada especificamente para o filme, foram tomadas diversas liberdades criativas, entre elas o modo de comunicação dos Ochis, o que permite uma cena final grandiosa. Ochis não se comunicam por palavras e sim por sentimentos e emoções transmitidas por situações de composição sonora e principalmente de silêncio e olhares, ao invés de exposições verbalizadas por meio de diálogos.
Em certo momento, comecei a fazer comparações entre A Lenda de Ochi e o primeiro A Era do Gelo (2002, Chris Wedge). Ambos os filmes se utilizam de momentos de experiências emocionais, seja a cena final da produção de Saxon, que traz uma redenção para a questão familiar, ou a cena da caverna no filme de Chris Wedge, aonde aprendemos a história de Manny, em nenhuma destas cenas o diálogo é necessário, e sim a sensação e a catarse que a cena transmite para a audiência.
A questão que podemos pensar é: qual seria este sentimento? Um Ochi não é inofensivo como Gizmo em Gremlins, ele não é verbal como Stitch, e nem um gatinho tamanho família como o Banguela. Entre todos estes, o Ochi é o que mais remete como um animal selvagem em si, a ponto de morder Yuri em certo ponto da produção.
Da mesma forma, Yuri não é tão carismática quanto Lilo, ou caricata quanto Soluço, sendo mais introspectiva e peculiar, fato que gira toda a sua relação com seu pai, que não apresenta a capacidade de enxergá-la como realmente é, optando por tentar mudá-la.

Willem Dafoe e Finn Wolfhard em A Lenda de Ochi- Divulgação A24
O sentimento é transmitido por meio da catarse de uma trilha grandiosa que acompanha toda a produção, e um senso de tranquilidade trazida por meio da trilha sonora que se baseia, grande parte, em instrumentos de cordas e sopro, que trazem um tom lúdico para a produção, apesar de toda a escuridão presente na produção, o final é extremamente bem iluminado, um paralelo constante ao longo do filme.
A Lenda de Ochi é algo novo e extremamente atraente em quesito visual, apesar de penar um pouco em sua narrativa acelerada demais em seu começo, e lenta demais durante todo o resto da produção, cansando o público já acostumado com filmes desta premissa de animais encontrados por crianças.
Ao tentar contar a história de famílias perdidas que se reconectam, Isaiah Saxon construiu um belo e grandioso filme, que se perde na própria estrutura. Ele é um filme pequeno, ao mesmo tempo que apresenta um universo gigantesco ao seu redor, é um filme voltado para crianças, mas, tenso e assustador demais em certos momentos, é um filme que discute família, porém, não apresenta um contexto claro para esta família.
A Lenda de Ochi é um filme único e arriscado que não alcançará um sucesso imediato, porém, sua ousadia e coragem em construir um universo mágico original, trazendo muito coração para sua narrativa e um final lindo e indescritível, será lembrado daqui à 20 anos como um clássico que poucos conhecem, da mesma forma que produções como História Sem Fim, e isto é algo de se orgulhar.
Com distribuição da Paris Filmes, A Lenda de Ochi estreará nos cinemas nacionais no dia 29 de Maio.
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