Dirigido por Anna Muylaert, A Melhor Mãe do Mundo segue a temática de outros filmes da diretora
Por conta de seu olhar crítico sobre a sociedade brasileira, Anna Muylaert se tornou rapidamente uma das diretoras mais potentes do cinema nacional, apresentando em seus potentes dramas um forte retrato de classes sociais menosprezadas e de vínculos familiares, presente em produções como Durval Discos (2002, Anna Muylaert), Que Horas Ela Volta? (2015, Anna Muylaert), Mãe só há uma (2016, Anna Muylaert), O Clube das Mulheres de Negócios (2024, Anna Muylaert), para citar alguns, até sua produção mais recente: A Melhor Mãe do Mundo.
Pode-se fazer um paralelo bem claro entre A Vida É Bela (1999, Roberto Benigni) e A Melhor Mãe do Mundo, afinal, ambos tratam de uma figura parental que passa por dificuldades, e opta por criar brincadeiras com o intuito de manter preservada a inocência dos filhos, porém, enquanto Benigni retrata esta situação do ponto de vista masculino, em um dos períodos mais obscuros da humanidade, Anna Muylaert foca em Gal, Shirley Cruz, uma catadora de recicláveis que foge dos abusos do parceiro Leandro, Seu Jorge. Para proteger seus filhos, ela abandona a casa, coloca suas duas crianças pequenas, Rihanna e Benin, na carroça e as leva numa jornada pela cidade de São Paulo, incentivando uma grande aventura para os pequenos.

Cena de A Melhor Mãe do Mundo- Divulgação Biônica Filmes
Existem muitas coisas para se analisar na produção, o primeiro é novamente o retrato de uma classe social marginalizada, desta vez na forma de uma catadora de recicláveis, uma profissão essencial, ainda mais em uma cidade gigantesca como SP, porém, menosprezada e desprezada pelas grandes classes sociais.
Enquanto existem road movies, e boat movies como O Último Azul (2025, Gabriel Mascaro), A Melhor Mãe do Mundo pode ser considerado um “carroça movie“, na medida que a produção acompanha Gal e seus filhos, em uma jornada de carroça do Glicério até Itaquera, passando por diversas ruas e vielas que todo bom paulistano irá reconhecer.
Com o intuito de manter a inocência das crianças, Gal constrói uma aventura, em que eles acampam na carroça, vêm os fogos de artificio, acariciam o cavalo de outro catador, tomam banho na fonte, ganham uma bola de um colega de Gal, encontram no lixo itens que são um verdadeiro tesouro, como uma camisa do Corinthians e um óculos de mergulhador, tudo enquanto Gal é menosprezada, assediada sexualmente, e rebaixada, se mantendo forte não por ela mesmo, porém, para seus filhos, os privando desta situação.
Ao encontrar refúgio na casa de sua prima, Gal se sente segura até Leandro a encontrar novamente. É indescritível a presença de Seu Jorge em A Melhor Mãe do Mundo, com menos de 20 minutos de tela ele apresenta a capacidade de roubar para si todo o brilho, deixando Shirley Cruz extremamente fraca em comparação, o que é perfeito para a produção, afinal, ao interpretar um marido abusivo, é extremamente necessário ele ser potente e amedrontador, dando medo com o mínimo olhar, algo que o cantor exerceu com maestria.

Seu Jorge e Shirley Cruz em cena de A Melhor Mãe do Mundo-Divulgação Biônica Filmes
Ao construir um retrato da força e resiliência materna de uma mulher que não desiste por mais que o mundo inteiro a rebaixe, Anna Muylaert orquestra um filme forte, sensível e esperançoso, principalmente no simbolismo do jogo do Corinthians como um espaço aonde tudo pode ser esquecido, como um espaço de acolhimento dentro do caos da vida, e com Maria, Maria (Milton Nascimento, 1978) encerrando a produção com sutilidade, um verdadeiro ode à mulher brasileira.
A fotografia é excelente e o design de som deve ser destacado na medida que gera uma agonia e transporta os pensamentos internos de Gal para o mundo externo, desde o silêncio quando revê Leandro, até a cacofonia sonora ao perceber o sumiço dos filhos, se tornando tão agonizante que é impossível pensar em outra coisa, algo semelhante do que Coppola fez com a cena do trem, em O Poderoso Chefão (1972, Francis Ford Coppola).
Por conta de sua narrativa, e do lento e pessoal retrato dramático, A Melhor Mãe do Mundo provavelmente apresentará um público mais enxuto do que outros lançamentos nacionais recentes como Homem com H (2025, Esmir Filho) e Manas (2025, Marianna Brennand Fortes), algo semelhante com o que ocorreu com outros filmes de Anna Muylaert, porém, com o tempo A Melhor Mãe do Mundo encontrará seu público, e será reconhecido como mais uma boa produção da diretora, além de um retrato honesto sobre a força interna da mulher brasileira.
A Melhor Mãe do Mundo estreia nos cinemas brasileiros em 7 de agosto e conta com distribuição da +Galeria.
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