Dirigido por Petrus Cariry, A Praia do Fim do Mundo une real e simbólico em jornada poética sobre envelhecimento e futuro
Poucos cineastas brasileiros são tão autorais e esteticamente arrebatadores quanto Petrus Cariry. Acumulando funções como direção, roteiro, fotografia, edição e produção, o realizador cearense mantém um controle criativo raro, construindo obras lentas, contemplativas e de forte impacto visual.
Desde sua primeira produção, O Grão (2007, Petrus Cairiry), o diretor já demonstrou uma marca única no retrato da solidão, da memória e da finitude, onde a câmera, os planos longos e o ciclo narrativo, um sentimento sisifico que sempre retorna ao mesmo lugar, transformam a paisagem em extensão da interioridade dos personagens. Enquanto Mais Pesado é o Céu (2023, Petrus Cairiry) lida com a potência do sertão nordestino, A Praia do Fim do Mundo leva o nosso olhar para o oceano, uma natureza assustadora e potente, que somente é ampliado por conta de sua exemplar fotografia.
Filmado em preto e branco, A Praia do Fim do Mundo evoca a força fotográfica de Sebastião Salgado, mestre do contraste entre luz e sombra, e do retrato humano em suas imagens. Assim como na obra do fotógrafo falecido em março deste ano, Cariry usa a ausência de cor para extrair um sentimento de nostalgia e solidão, acentuando tanto a dimensão humana quanto o aspecto quase mítico que permeia seus personagens, principalmente pelas alegorias com a história de Jó, de modo semelhante ao explorado por outros cineastas como Juliana Rojas em As Boas Maneiras (2017) e Andrucha Waddington em A Casa de Areia (2005).

Cena de A Praia do Fim do Mundo- Divulgação Primeiro Plano
A narrativa acompanha Alice, jovem ambientalista, e sua mãe Helena, uma excelente Marcélia Cartaxo. Duas mulheres que vivem em uma casa castigada pelo avanço do mar. Enquanto a filha deseja partir, a mãe insiste em permanecer, presa à memórias de um passado que não existe mais. A tensão entre as duas reflete um embate maior: a luta contra a natureza, ou contra o tempo, que inevitavelmente o ser humano sempre irá perder.
O oceano, filmado em planos longos e hipnóticos, é simultaneamente dádiva e destruição, origem da vida e força vingativa. Tal ambiguidade ecoa na própria casa, em ruínas tanto pela ação das ressacas quanto pelo desgaste da relação entre mãe e filha. Apesar do foco ser nestas mulheres, a presença de um catador de lixo, enigmático e marginal, sugere mais camadas à história, remetendo ao desaparecido pai de Alice, mas Cariry prefere manter o mistério, entregando ao espectador a liberdade da interpretação.
Ao longo de A Praia do Fim do Mundo, Cariry constrói um mosaico de dualidades: a esperança, simbolizada pelo filho que Alice carrega, convive com a solidão; a vida se anuncia, mas a morte é inevitável, assim, mantendo a marca de seus trabalhos anteriores e as escolhas temáticas que tanto gosta: finitude, memória e resistência frente ao inexorável.

Cena de A Praia do Fim do Mundo- Divulgação Primeiro Plano
O filme beira o experimental: o ritmo é lento, a trilha sonora alterna entre o silêncio e sons que evocam entidades e ritos tradicionais, como se as personagens estivessem presas em um purgatório entre o real e o simbólico. Helena não consegue abandonar sua teimosia, Alice se recusa a deixar a mãe, e assim o confronto se transforma em ciclo eterno, sem vencedores, apenas desgaste.
Produzido pela Iluminura Filmes e distribuído pela Sereia Filmes, A Praia do Fim do Mundo estreia nos cinemas em 4 de setembro.
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