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Crítica – Cézanne e Eu – Amizade e Arte

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O que dizer de uma amizade tão especial entre dois artistas talentosos? “Cezanne e Eu” é um filme que conta a história do pintor Paul Cézanne e do escritor Emile Zola.

O longa-metragem francês começa já intercalando belas imagens de coisas diversas com materiais de pintura. É como a vida, oscilando entre a rotina e a arte. Viver o cotidiano também pode ser considerado uma forma de arte, certo? Porém o dia a dia desses dois não é lá muito comum.

Ainda garoto, o novo aluno Emile Zola começa a sofrer bullying dos colegas e quem vai ajudar é nada mais, nada menos, do que o garoto Paul Cezanne. Neste momento começa uma “amizade eterna”, permeada por mulheres, bebidas, brigas… e arte, claro.

Cezanne – feito com coração por Guillaume Gallienne – é rico, vive bem em uma mansão, sempre com boa comida e entrando em conflito com o pai devido à sua vontade de ser artista, enquanto Zola – vivido por Guillaume Canet, que consegue fornecer as nuances pedidas pelo personagem – é pobre e mora com a mãe, tem que catar pintinhos perdidos na rua, em dias de chuva, para que tenha algo para comer. “Consegui três hoje, mãe”. A discrepância entre suas criações é bem explorada e parte extremamente relevante em suas escolhas. Paul é um boêmio rebelde e Zola ambiciona ascensão social.

Os atores conseguem trazer verosimilhança para essa amizade cheia de intimidade. Há uma abundância de belíssimas tomadas ao ar livre, muitas delas em Aix-en-Provence, onde Cézanne busca inspiração em meio à exuberante natureza. Temos muitas alusões a algumas pinturas famosas daquele período, tanto nos diálogos quanto em várias cenas. Em especial, a obra-prima de Manet, “Le Déjeuner sur l’Herbe” (O almoço sobre a relva ou O piquenique no bosque, em português).

Ao longo do filme, o espectador é convidado a vivenciar uma outra época, o fim do século 19, e o mundo artístico, seguindo o crescimento desses dois em busca de reconhecimento para suas respectivas artes, sempre se ajudando de alguma forma. O que seria das pinturas de Cézanne sem o apoio de Zola? E como seriam os livros de Zola sem a convivência com Cezanne? É como se um precisasse do outro, uma simbiose. Nesse meio tempo temos Gabrielle (a charmosa Alice Pol), admirada de longe pelo tímido Emile, mas que cai nos braços do atirado Paul. Um triângulo amoroso clássico.

Engraçado dar de cara com reflexões importantes sobre amizade. Por exemplo, muitas vezes as pessoas tendem a julgar os amigos por suas falhas, e acabam “preferindo” estranhos que não conhecem. O que é amizade? Talvez seja não ser juiz do outro, mero ser humano como você, crescer junto, em uma troca constante de aprendizado. Fica uma lição pairando, a de que no amor a traição até pode ser perdoável, mas na amizade não. Há controvérsias. Contudo, quem pode te ferir mais do que um amigo? Conhece suas tristezas e fraquezas e pode te machucar como nenhuma outra pessoa.

A amizade… nem mesmo a força do tempo pode destruir? Só que tem que ser de verdade. Entramos assim em outra reflexão, o que é verdade? Entre amigos, muitas vezes, é onde mais existe inveja e despeito, o que acaba conduzindo a caminhos tortuosos. Em outras tantas, seu único apoio, a mão que te tira do precipício. Como toda relação humana, é complicado.

Paul Cézanne segue lutando até o fim de sua vida pelo reconhecimento de suas pinturas, sofre, é grosseiro com todos ao seu redor, onde jorra suas frustrações. A amizade de Paul e Emile é chacoalhada com força com a publicação do romance A Obra, de Zola, o qual pinta Cézanne como um “perdedor patético”. O pintor segue vendo Zola como um ingênuo bobo romântico tímido, adjetivos que contrariam sua persona literária brutal e crítica à realidade social.

Seria Cézanne um gênio abortado? Não. Sua visão vai além do que poderiam entender, ele quer mais do que desenhos, deseja “pintar a fluidez do ar, o calor do sol, a violência das rochas”.

Daniele Thompson, escritora e diretora, conta a história com sensibilidade, com o mérito de não cair na armadilha de se ater a reverenciar os dois gênios, e nos presenteia com pinceladas sublimes sobre as diferenças entre os seres humanos, a arte e dois amigos tão diferentes.

Jornalista Cultural. Um ser vivente nesse mundo cheio de mundos. Um realista esperançoso e divulgador da cultura como elemento de elevação na evolução.

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Nenhum saber para trás: os perigos das epistemologias únicas, com Cida Bento e Daniel Munduruku | Assista aqui

Veja o filme que aborda ações afirmativas e o racismo na ciência num diálogo contundente

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Nenhum saber para trás: os perigos das epistemologias únicas | com Cida Bento e Daniel Munduruku

Na última quinta-feira (23), fomos convidados para o evento de lançamento do curta-metragem Nenhum saber para trás: os perigos das epistemologias únicas | com Cida Bento e Daniel Munduruku. Aconteceu no Museu da República, no Rio de Janeiro.

Após a exibição um relevante debate ocorreu. Com mediação de Thales Vieira, estiveram presentes Raika Moisés, gestora de divulgação científica do Instituto Serrapilheira; Luiz Augusto Campos, professor de Sociologia da UERJ e Carol Canegal, coordenadora de pesquisas no Observatório da Branquitude. Ynaê Lopes dos Santos e outros que estavam na plateia também acrescentaram reflexões sobre epistemicídio.

Futura série?

O filme é belo e necessário e mereceria virar uma série. A direção de Fábio Gregório é sensível, cria uma aura de terror, utilizando o cenário, e ao mesmo tempo de força, pelos personagens que se encontram e são iluminados como verdadeiros baluartes de um saber ancestral. Além disso, a direção de fotografia de Yago Nauan favorece a imponência daqueles sábios.

O roteiro de Aline Vieira, com argumento de Thales Vieira, é o fio condutor para os protagonistas brilharem. Cida Bento e Daniel Munduruku, uma mulher negra e um homem indígena, dialogam sobre o não-pertencimento naquele lugar, o prédio da São Francisco, Faculdade de Direito da USP. Um lugar opressor para negros, pobres e indígenas.

Jacinta

As falas de ambos são cheias de sabedoria e realidade, e é tudo verdade. Jacinta Maria de Santana, mulher negra que teve seu corpo embalsamado, exposto como curiosidade científica e usado em trotes estudantis no Largo São Francisco, é um dos exemplos citados. Obra de Amâncio de Carvalho, responsável por colocar o corpo ali e que é nome de rua e de uma sala na USP.

Aliás, esse filme vem de uma nova geração de conteúdo audiovisual voltado para um combate antirracista. É o tipo de trabalho para ser mostrado em escolas, como, por exemplo, o filme Rio, Negro.

Por fim, a parceria entre Alma Preta e o Observatório da Branquitude resultaram em uma obra pontual para o entendimento e a mudança da cultura brasileira.

Em seguida, assista Nenhum saber para trás:

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