Dirigido por Matías Bize, O Castigo é um forte retrato das desavenças, arrependimentos e impulsividades que carregamos ao longo da vida, e das consequências que surgem a partir deles.
Existem duas vertentes principais de filmes sobre maternidade. A primeira é aquela que expõe as dificuldades de ser mãe: os problemas, a dor de cabeça, o desgaste, mas que, ao final, reafirma quão gratificante e único é esse processo. Um exemplo recente é a comédia nacional Mãe Fora da Caixa (2025, Manuh Fontes). Em contrapartida, há uma linha bem mais interessante e psicologicamente perturbadora, que analisa com maior humanidade a psique de mulheres que não necessariamente desejavam ocupar o papel materno, mas que precisam lidar com isso, mesmo a contragosto. Nessa vertente, destacam-se Precisamos Falar Sobre o Kevin (2011, Lynne Ramsay) e o recente O Castigo.
Filmado inteiramente em plano-sequência, o longa já começa direto na ação, com Ana, Antonia Zegers, e Mateo , Néstor Cantillana, dirigindo em uma autoestrada. Agoniado, Mateo insiste para que Ana volte, que lentamente, e aparentemente a contragosto, retorna. Ao longo de 86 minutos, acompanhamos o mistério envolvendo quem são essas pessoas, por que abandonaram o filho de 7 anos no meio da estrada e por que, a partir desse momento, a vida deles nunca mais será a mesma.

Antonia Zegers e Néstor Cantillana em cena de “O Castigo”-Divulgação Filmes do Estação
Antonia Zegers entrega uma atuação magistral, não apenas graças ao potente monólogo final, mas também pela expressiva interpretação silenciosa de uma mãe em conflito interno com seus próprios desejos e pensamentos. Desde o início percebemos que Ana está incomodada com algo, mas só compreendemos plenamente sua dor perto do fim, e isso nos destrói tanto quanto a ela. Para Ana, ser mãe não é satisfatório, belo ou natural; é perder o próprio desejo e a vontade de viver, um pensamento profundamente humano mas contrário à imagem de perfeição que recai sobre a figura materna.
Como explica o documentário Bruxas (2024, Elizabeth Sankey), a ideia de que uma mãe deve ser perfeita, incansável e inteiramente devotada ao filho, noção sustentada por parte da sociedade. Esse peso recai, sobretudo, sobre as próprias mulheres, que são julgadas, inclusive por elas mesmas, simplesmente por existirem e por tentarem cumprir esse papel, mesmo que contra a própria vontade, como é o caso de Ana, vivendo justamente este castigo de ter aceito o papel de mãe, mesmo que contra sua própria vontade.
É surpreendente o nível de cuidado e controle apresentado, sobretudo considerando que o filme não possui cortes em sua duração, dependendo da atuação do elenco e de um roteiro que, apesar de se arrastar em alguns momentos, conduz o espectador por uma montanha-russa emocional e ansiosa, culminando em revelações potentes, entregues com franqueza e humanidade.
Construído com base em silêncios e ruídos, O Castigo oferece reflexões e não respostas. O papel de Matías Bize não é julgar as ações de Ana, e o nosso, como espectadores, também não é, o que importa ao final é observar com empatia esse mundo e essa crise familiar que, após os créditos finais, sabemos que jamais voltará a ser a mesma. Esse é o grande valor da produção: as reflexões e discussões que ela desperta não somente sobre maternidade, mas também como a vida em casal.

Antonia Zegers e Néstor Cantillana em cena de “O Castigo”-Divulgação Filmes do Estação
Acima de tudo, O Castigo é um filme sobre as decisões difíceis que tomamos na vida, seja por medo, impulso, receio ou simplesmente para agradar o outro, e sobre as consequências que vêm junto com elas. Consequências que, muitas vezes, duram mais do que gostaríamos e, em outras, jamais vão embora, em um castigo eterno.
Distribuído pela Filmes do Estação, O Castigo estreia nos cinemas no dia 11 de dezembro.
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