Entrevistas
Mergener Mendes, da Nove Zero Nove | “Os rótulos são prisões. Nenhum rótulo é suficiente para definir um ser humano.”
Publicado
3 anos atrásem

Nove Zero Nove tem um vocalista não-binário. Nessa entrevista, Mergener Mendes explica essa questão e como paralelamente trabalha em um escritório de advocacia e canta rock. Inclusive, deixa claro que pretende continuar unindo as duas coisas na sua jornada. Luta pacificamente com sua música e com suas escolhas contra a rotulação dos seres humanos e os estereótipos. Mergener tem uma simpatia mesclada com doçura e firmeza de valores, procura pregar o amor e exala otimismo nessa conversa. Fala ainda sobre os últimos singles da Nove Zero Nove, “Cocaine” e “Sopro“, o qual conversa muito com o momento atual de pandemia devido ao coronavírus e fala de uma fã que faleceu.
Alvaro Tallarico: Mergener Mendes, não é isso?
Mergener Mendes: Sim, meu nome de registro é outro (risos). Mas quando comecei a me descobrir não-binário e depois transexual que são duas coisas diferentes. Não-binário é você não se comportar como homem nem como uma mulher, você se comporta do jeito que os dois fazem, ou nenhum dos dois. Você se comporta de uma forma que ninguém pode te chamar de homem ou te chamar de mulher. Você me chamar de mulher, para mim não faz sentido, porque não me identifico e não me comporto como uma mulher, entre aspas. E aí não vou nem entrar no que é ser mulher, ser homem, porque cada um vai dizer uma coisa.
Só sei que eu não sou nem mulher nem homem e no ano passado eu descobri que além disso eu quero modificar meu corpo. Eu nasci fêmea, mas eu teria sido mais feliz, acredito, se tivesse nascido macho. Então pretendo masculinizar meu corpo, começar a terapia hormonal. O que não quer dizer que vou começar a agir como um homem, só quer dizer que meu corpo vai ser mais masculino, mas vou continuar sendo nem homem nem mulher. E aí quando me descobri transexual eu pensei “me incomoda muito me chamaram de ela”, me tratarem no feminino, me chamarem de Maria, é extremamente feminino, não combina comigo.
É que nem virarem para você e te chamarem de ela, sendo que você é ele. Não encaixa. Não bate na cabeça. E comecei a ter esse incômodo e toda vez que alguém me chamava de Maria eu ficava triste, ficava magoado e tal.
Até que eu falei chega, comecei a assumir pronomes masculinos e a encher o saco de todo mundo ao meu redor para me chamarem de ele, de Mergener, porque muita gente já me chama de Mergener. Porque é um sobrenome meio diferente, né? E aí viam esse sobrenome, às vezes me chamavam de Mergener e falei, cara, vou pegar e usar de nome social, que é mais fácil. Porque Mergener se você ouve, primeiro que chama atenção, é um nome esquisito, e segundo que você não pensa imediatamente ele ou ela. Não vem na sua cabeça que nem João, Maria, que você automaticamente pensa ele, ela. É um nome agênero. E aí eu pensei faz todo o sentido e agora já faz quase uma ano que adotei esse nome social e passei a usar pronomes masculinos. E é muito raro hoje em dia alguém me tratar no feminino ou me chamar de Maria. Tem sido um processo muito difícil, mas hoje em dia está mais fácil.
Alvaro Tallarico: E essa questão de trabalhar num escritório de advocacia e ser vocalista da banda independente Nove Zero Nove?
Mergener Mendes: Sim, é, é difícil. As pessoas sempre me perguntam como arrumo tempo e sempre respondo que durmo pouco (risos). E não deixa de ser verdade. Acabo tendo que sacrificar coisas para dar conta de tudo que quero fazer mas eu amo essas duas carreiras. Eu sonho em ser advogado e em ser músico e viver desses dois e juntar os dois. O plano é um dia ter meu próprio escritório de advocacia ou trabalhar em um escritório onde possa trabalhar com direito autoral. E aí eu vou juntar a minha expertise como músico com a minha expertise como advogado, e aí vou ser a melhor pessoa para lidar com o direito dos artistas. E esse é o plano, ainda está longe, por enquanto estou levando do jeito que dá.
De segunda a sexta no escritório, fim de semana com as bandas ensaiando, fazendo show, fazendo turnê, viajando. É cansativo para caramba, tem meses que não tem um dia de folga, ou que posso ficar totalmente à toa porque os fins de semana estão ocupados, os dias de semana estão ocupados, madrugadas estão ocupadas. Mas meu psicólogo costuma falar que eu gosto disso, essa produtividade me motiva. E hoje em dia acho que seu precisasse largar uma das bandas ou minha carreira no direito eu ia ficar de depressão assim, então é difícil mas ao mesmo tempo é prazeroso, e aí parece que não é difícil, parece que é tranquilo levar. Não consigo abrir mão dessas duas paixões, parece que se abrisse mão de uma das duas minha vida ficaria vazia.
AT: Parece que são coisas contrastantes, mas seu objetivo é conseguir uni-las, né?
Mergener Mendes: Sim. Você, quando , quando você ouve em primeiro lugar, “ah, legal você é músico”, e quando a pessoa ouve que eu trabalho com advocacia, ficam “Hã?”. A mesma coisa quando a pessoa sabe que eu trabalho com advocacia e falo que tenho duas bandas independentes e que sou vocalista e baixista, elas ficam “Hã?”. Parece que não cabe ter as duas coisas no mesmo ser humano, mas é possível, inclusive tem muitas outras pessoas que fazem isso.
Inclusive acho que a única diferença é que eu tenho plano de fazer com que as duas sejam carreiras profissionais, ao invés de levar uma como um hobby. Geralmente é um advogado que tem a música, a arte, como um hobby. Eu pretendo ser profissional nas duas e juntar as minhas habilidades das duas para ter uma carreira só no futuro. Se vou conseguir? Veremos (risos), mas estou trabalhando para isso incessantemente.
Alvaro Tallarico: É, tanto profissionalmente, tanto como pessoa, você acaba levantando sempre essa bandeira do não-rótulo, do não-estereótipo.
Mergener Mendes: Cara, com certeza, é exatamente isso. Acho que os rótulos são prisões, são correntes. E todas as vezes na minha vida que tentei me rotular e me encaixar em alguma coisa pré-disposta, por exemplo, mulher, lésbica, advogado, músico, baixista… nenhum deles é suficiente! Nenhum rótulo é suficiente para definir um ser humano. Todas vezes que eu tentei me encaixar no rótulo eu tive que abrir parte de mim, abrir mão de alguma parte de mim para poder me encaixar. Então eu percebi que os rótulos na verdade são a consequência, não são a causa.
Você primeiro existe e depois encontra alguns rótulos para te definir, mas se você existir para procurar qual rótulo te define você nunca vai ser feliz porque nenhum rótulo vai te definir completamente. E aí serve tanto para música, quanto pro direito, quanto para não-binariedade, quanto para transexualidade, e acho que é muito o que você falou, eu tento cada vez que eu posso tornar o mundo mais fluido possível, porque acho que as pessoas serão muito mais felizes se o mundo não for todo preto no branco, sabe?
AT: O Nove Zero Nove teve o single “Cocaine” e ele também traz uma questão social inclusive, né?
Mergener Mendes: Sim, “Cocaine” é uma música composta pelo Pedro Arruda, ex-guitarrista da banda. Fala muito sobre superação, sobre uma pessoa que tinha esse vício, né? Na cocaína, e resolveu abrir mão disso, resolveu largar, resolveu mudar de vida porque isso não estava levando a lugar nenhum e foi nosso primeiro single com a nova formação.
Aliás, ouça “Cocaine”:
Já tem coisa nova para vir por aí. Infelizmente, nessa música, eu só tive a chance de gravar a voz, não participei do processo de composição, a música já estava pronta quando eu cheguei, o que não significa que eu não goste dela, claro. Obviamente gosto, é meu primeiro registro, minha primeira marca d’água na história do Nove então fico muito feliz de lembrar da música.
E agora vão chegar músicas novas aí, que eu estou compondo junto com a galera, novas composições.
Inclusive, ouça uma delas, “Sopro”, lançamento da Nove Zero Nove:
Reforçando sempre essa ideia de que os rótulos não vão levar a gente a lugar nenhum, de que a ideia é todo mundo ser quem é, e amar todo mundo, e respeitando todo mundo, mudando um pouco a imagem do Nove Zero Nove, não só sendo uma coisa preocupada com o politicamente correto, mas preocupada com uma forma de mudar o mundo de uma forma pacífica, através do amor. Pregando o amor e mostrando que todo mundo tem direito de ser como é. E agora, comigo como vocalista, eu sinto que com a Ju como guitarrista a gente está representando muito mais as minorias e isso dá mais força para nosso discurso, no sentido que é fácil falar “sim, todo mundo tem lugar, todo mundo pode ser quem é”, mas quando tem três pessoas no palco que fogem do padrão cis hétero-normativo, acho que reforça ainda mais essa ideia, dá mais veracidade. Eu sinto.
É uma paixão muito grande para mim. Encontrei no Nove Zero Nove um megafone para poder em todo lugar que gente pisa falar uma mensagem que eu já levava no meu coração, na minha vida, no meu dia-a-dia. O Nove Zero Nove me deu literalmente um microfone para poder levar essas mensagens em cada show, em cada momento, e a gente toca as pessoas. A gente termina o show o pessoal vem abraçar a gente, fala que a mensagem que a gente passa é muito importante. Não tem como não se apaixonar por isso.
Afinal, Mergener falou muito mais, ouça a entrevista completa aqui:
Créditos do Podcast:
// Apresentação, produção e roteiro: Alvaro Tallarico // Edição: Fachal Júnior // Foto de Mergener no show da Nove Zero Nove por Alvaro Tallarico // Siga @viventeandante no Instagram e no Twitter // No Facebook: facebook.com/viventeandante //
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Jornalista Cultural. Um ser vivente nesse mundo cheio de mundos. Um realista esperançoso e divulgador da cultura como elemento de elevação na evolução.

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O Pastor e o Guerrilheiro | Confira entrevista exclusiva com Johnny Massaro
Longa-metragem chega aos cinemas brasileiros com distribuição da A2 Filmes
Publicado
2 meses atrásem
13 de abril de 2023Por
Redação
Nesta quinta-feira, dia 13 de abril, o longa-metragem O Pastor e o Guerrilheiro, do cineasta José Eduardo Belmonte, chega exclusivamente aos cinemas brasileiros com distribuição da A2 Filmes. O protagonistas ganham vida através dos atores Johnny Massaro e César Mello, em grandes atuações. Além disso, o filme ainda conta com a presença do saudoso Sérgio Mamberti (O Homem Que Desafiou o Diabo e Castelo Rá-Tim-Bum), em seu último trabalho.
A trama se passa nas décadas de 1960, 1970 e nos últimos dias de 1999, na virada do milênio. Em 1968, o jovem comunista João (Johnny Massaro) deixa a universidade e vai para uma guerrilha na Amazônia. Lá é preso, sofre torturas e vai para a prisão em Brasília, onde encontra Zaqueu (César Mello), um cristão evangélico, preso por engano. Então sofrem juntos, superam diferenças ideológicas, se ajudam e marcam um encontro para 26 anos depois, à meia-noite, na virada do milênio, em cima da Torre de TV de Brasília.
Em seguida, confira nossa entrevista com Johnny Massaro:
Produzido por Nilson Rodrigues e com o roteiro de Josefina Trotta, inspirado em uma história real, o filme foi rodado no Estado do Tocantins, às margens do Rio Araguaia, e em Brasilia, e conta com a produção executiva de Caetano Curi, direção de fotografia de Bárbara Alvarez, direção de arte de Ana Paula Cardoso, direção de produção de Larissa Rolin, música de Sascha Kratzer e figurino de Diana Brandão.
Quer saber se é bom? Já vimos. Olha aí a crítica:
Com distribuição da A2 Filmes, a estreia do filme O Pastor e o Guerrilheiro aconteceu no Festival de Gramado e o filme chegará agora no dia 13 de abril de 2023 aos cinemas de São Paulo, Rio de Janeiro, Brasília, Curitiba, Belo Horizonte, Salvador, Porto Alegre, Vitoria da Conquista, Tocantis, Palmas, Campo Grande, Niterói, Macéio, Natal, Manaus, João Pessoa, Guararapes, Goiania e Fortaleza.
Ah, também conversamos com Túlio Starling, que também participa do filme. Confira:
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