O mercado cinematográfico mundial está em crise. É um momento de incerteza e apenas com o tempo veremos se as produtoras vão ter um futuro ou não. Já que o cronograma de lançamentos está congelado (salvo “Trolls 2” que virou um exemplo de sucesso no lançamento direto para streaming) temos a agradabilíssima opção de tirar do atraso aquela lista de filmes que dizemos que vamos assistir e ficamos enrolando indefinidamente. Com tempo de sobra e a cabeça precisando desesperadamente de férias desse vazio e estresse do dia-a-dia, finalmente consegui assistir duas obras que me deixaram literal e figurativamente sem ar: Solaris do gênio soviético Andrei Tarkovski e Persona do igualmente brilhante diretor sueco Ingmar Bergman.
Como um jovem crítico e comentarista do cinema tenho a tendência de procrastinar na minha lista de filmes que deveria assistir,. Da última vez que conferi eu tinha cerca de 800 títulos esperando para serem assistidos. Sim, isso é algo que me envergonha, mas acontece. No momento, só me arrependo amargamente de não ter visto antes Persona e Solaris; ambos filmes europeus de vanguarda que até hoje destroem quaisquer ideias pré-formadas que o espectador poderia ter antes de presenciar essas obras assombrosas.
Meu intuito aqui é simplesmente incentivar que você se liberte das séries repetidas assistidas de cabo a rabo na Netflix e cumpra a promessa de que iria assistir a ‘Amélie’, ‘O Iluminado’, ‘Lady Bird’, ‘Moonlight’, ‘O Poderoso Chefão 2’ ou qualquer outro filme que você tenha dito que iria assistir e não viu ainda.
Persona
De uma forma simples, Persona é um filme que trata sobre a projeção das nossas personalidades sobre aqueles à nossa volta e a nossa interpretação das nossas auto imagens. A frase anterior não tem valor nenhum e isso não importa. Persona foi descrito como o Everest da análise cinematográfica. Ou seja, tudo que já foi dito, ponderado e discutido sobre esse longa-metragem pode ser contradito visto que está cercado por uma névoa densa de significados que nem as próprias atrizes tinham certeza do que se tratava.
Afora essas considerações esotéricas sobre o real significado do enredo há um filme belíssimo. Em seus improváveis 85 minutos de duração vai te chocar, impressionar, deleitar e enojar. Não tenho credenciais suficientes para julgar, apenas para exaltar Persona , então veja, vale a pena.
Solaris
Esse filme sci-fi de 1972 é bem mais simples de definir do que Persona, mas não de comentar. Solaris é decididamente uma das melhores obras do cinema soviético. A história gira em torno de um psicólogo que é enviado para uma estação espacial na órbita do planeta Solaris para investigar os problemas psíquicos que os cientistas tripulantes estão demonstrando. Logo ele descobre que a água do planeta é capaz de materializar as obsessões e memórias reprimidas da tripulação.
Solaris te faz questionar até onde você pode conhecer alguém e o que é ser humano, e faz isso de uma forma atordoante. Seja pela narrativa entrecortada, a fotografia lisérgica ou os diálogos densos, você vai ficar preso nesse filme. Só não se preocupe muito com o fato de que a princípio não vai entender o porque algumas coisas estão acontecendo, estamos lidando com um filme de quase 50 anos que foi gravado numa sociedade fundamentalmente diferente da nossa, é de se esperar que tenha uma barreira cultural.
Esses dois monstros do cinema são apenas o começo da minha lista mas já é um passo. Eles demandaram intensamente da minha atenção e me recompensaram com duas experiências sem igual que mudaram eternamente a minha visão do que um filme pode ser, de como uma história pode ser contada. Espero que esse pequeno relato te anime para seguir no seu caminho com o cinema tanto quanto me animou para continuar no meu.