Estreia nesta quinta-feira (25/09), o novo longa-metragem do cineasta Paul Thomas Anderson. “Uma batalha após a outra” é impactante, intenso, inesperado e necessário em meio aos tempos conflituosos em que vivemos, atualmente.

Uma vida de batalhas
Na trama, o grupo revolucionário French 75 realiza diversas ações em prol de imigrantes em situação vulnerável. Logo no início, vemos um resgate de diversas famílias presas em um centro de detenção, fortemente vigiado por militares. Porém, após uma série de problemas, o grupo se debanda. Entre eles, a impetuosa e arrebatadora Perfidia Beverly Hills (Teyana Taylor) e o comedido Bob (Leonardo DiCaprio), cuja especialidade em explosivos faz a cabeça de Perfidia. A partir do envolvimento amorosos do casal, nasce a menina, Charlene.

Durante a mobilização de dispersão do grupo, Bob precisa esconder-se com a filha, com suas novas identidades, para evitar a perseguição do regimento comandado pelo coronel Steven J. Lockjaw (Sean Penn). Esse era o grupo rendido durante o resgate executado no início do filme, cujo comandante se torna a nêmesis dos integrantes do French 75. Dezesseis anos depois, ele surge novamente, como uma ameaça à jovem (agora Willa) (Chase Infiniti), o que faz com que Bob tenha que voltar à ativa, mesmo que (bastante) fora de forma.

Uma batalha contra uma crescente (e constante) intolerância
O roteiro do filme mostra-se bastante atual e crucial ao aludir de modo tão acintoso e áspero a crescente onda de intolerância que vem se espalhando mundo afora. Se pensarmos especificamente nos Estados Unidos, parece um retrato bem apurado de um país marcado pelo trumpismo. No entanto, a ideia do filme já vinha sendo trabalhada por Paul Thomas Anderson há pelo menos 20 anos, quando ele começou a desenvolver uma adaptação do livro “Vineland”, do escritor americano, símbolo da contra-cultura, Thomas Pynchon.
Essa crescente intolerância, na verdade é constante, e, por vezes, tem uma ressurreição de modo bastante vigoroso e ameaçador. Afinal, o livro de Pynchon, foi escrito durante a era de Ronald Reagan (não, por acaso, o grande exemplo que Trump segue, a ponto de um de seus objetivos seja resgatar a “Hollywood clássica” da década de 1980). Na trama, um ex-revolucionário, ex-hippie, é perseguido por uma agente federal, por sua militância na década de 1960.

Uma batalha por princípios
Os livros de Pynchon têm a fama de serem difíceis de serem lidos. Por consequência, suas obras também são consideradas complexas de serem adaptadas para o cinema. A primeira vez que isso ocorreu, foi no filme “Vício inerente” (2014), do mesmo por Paul Thomas Anderson. Mas, ao adaptar “Vineland”, o cineasta decidiu que não poderia ser fiel ao material original, e, com a benção do autor, a trama transformou-se na potência de um filme sobre o ato de se revoltar (e agir) contra as injustiças do mundo. Ou seja, uma batalha por princípios.
Mas, há uma linha tênue que separa mobilização por força do ódio da mobilização por necessidade de adaptação. Isso fica evidente no contraponto entre a debandada do French 75 e a organização de proteção a imigrantes, liderada pelo sensei Sergio St. Carlos (Benicio Del Toro), instrutor de karatê de Willa. Enquanto o grupo de Bob, faz questão de conversas codificadas, com diversas pormenores (que, inclusive dificultam a vida de Bob) e comunicar-se por celulares antigos, o sensei, usa celular tranquilamente, chama skatistas no meio da rua para ajudar e vai organizando e coordenando as pessoas com uma grande calma e paciência, bastante calculados. Provavelmente, provenientes de seu aprendizado em artes marciais.

Escolhas e consequências
O filme fala, também, sobre escolhas e suas consequências. Afinal, a trama vai se movimentando a partir desses caminhos que são criados a partir de atos, racionais ou emotivos, de cada um. Essas escolhas afetam as vidas de outros, mas especialmente os laços familiares.
O que é gerar uma nova vida, viver uma nova vida ou continuar uma vida? O roteiro não busca julgar os personagens, mas apresentar como que uma pessoa pode ser capaz de realizar ações, que ela não gostaria ou não se imaginaria realizando. Quer dizer, a vida nem sempre corre como nós planejamos, ou imaginamos. Sempre há uma quebra de expectativa.

Quebrando expectativas
Quebrar expectativas é algo que o cinema de Paul Thomas Anderson sempre fez muito bem. Quando esperamos que algo se suceda de determinada forma, há sempre uma ruptura. Em “Uma batalha após a outra”, isso acontece constantemente e de maneira bastante angustiosa. Com personagens de índole implacável, tal qual a rigidez e a brutalidade que vem sendo a principal arma dos intolerantes e autoritários.
Nos últimos anos, Leonardo DiCaprio, tem fugido cada vez mais do estereótipo da marca do galã. Ele tem feito personagens amorais, cruéis, confusos e frágeis, até. Estes dois últimos, o que descreve bem seu personagem. Fora da ativa, depois de muitos anos, Bob se vê tendo que resgatar um espírito adormecido em si, de uma luta que ele esperava que nunca precisasse acontecer. Se por um lado, ele pode parecer uma caricatura ineficiente, por outro lado, suas ações mostram a imponência de seus ideais.

Intolerância e hipocrisia
Ideais são algo que parecem em falta para muitas pessoas, e em especial de líderes de nações. O filme escancara e nos remete à mesquinharia e incompetência desses representantes, que não representam grande parte de suas populações, e nem fazem questão de esconder isso. É inevitável pensar, por exemplo, nos deslizes surreais cometidos por aqueles que queriam dar um golpe de estado entre 2022 e 2023, no Brasil.
Na trama, um grupo elitizado de supremacistas brancos, os “aventureiros natalinos”, surge como sátira à hipocrisia que reina na existência dos intolerantes. Tal qual a incoerência de Trump, que persegue imigrantes, sendo filho de uma imigrante e casado com uma, que chegou a trabalhar sem visto nos EUA. No filme, os membros do tal grupo, acreditam na inferioridade de pessoas que não são brancas, mas ficam revoltados, ao saber que uma fábrica de alimentos fechou por perseguição a imigrantes. Afinal quem vai fazer os serviços pesados que eles não querem fazer? Algo que foi muito bem retratado no filme “Um dia sem mexicanos” (2004).

Elenco
O elenco é outro ponto alto do filme. Leonardo DiCaprio está primoroso como um homem que tenta desesperadamente reencontrar um resquício de seu passado batalhador. Sean Penn impressiona como o vilão, extremamente cruel, e ao mesmo tempo com uma vulnerabilidade quase oculta.
Benicio Del Toro compõe de maneira bastante eficiente o sensei, que com sua calma e sabedoria inspira e instiga o personagem de Bob a lutar por quem ele ama. Teyana Taylor Está estupenda como a guerreira Perfidia, com uma atuação fenomenal. Por fim, temos a estreia de Chase Infiniti no cinema, que já ocorre de modo arrebatador. Embora pareça frágil e ingênua, inicialmente, Willa se torna uma pessoa destemida e segura em meio ao caos que se estabelece ao seu redor, de uma hora para a outra.

O filme mescla gêneros de maneira bastante orgânica. Com base no drama, com temas profundos e inquietantes, com momentos cômicos e ação palpitante. Como, por exemplo, uma cena de perseguição, na estrada, tão intensa e claustrofóbica que se sucede no estilo magnético e impressionante, típico dos filmes de Paul Thomas Anderson, ao utilizar a potência da desolação de cenários desérticos.
Onde assistir
Em suma, o novo filme de Paul Thomas Anderson, estreia nesta quinta-feira nos cinemas, e é uma pedida incrível. Consulte a rede de cinemas de sua cidade para encontrar sessões disponíveis.




Que review incrível! Me deu mais vontade ainda de assistir! Quando assisti ao trailer já tinha gostade, e cmsua crítica vem reforçar ainda mais esse desejo. Parabéns! Beijo enorme!