Dirigido por MacieJ J. Drygas, Trens utiliza imagens de arquivo para contar a história de um século tumultuado
Por volta da metade de Trens, Adolf Hitler aparece em cima de um trem, acenando para o povo que acena em retorno. Após quase uma hora de um documentário composto inteiramente por imagens de arquivo, ver uma personalidade tão impactante para o século XX, utilizando o meio de transporte que foi o símbolo da revolução industrial durante o século XIIX e XIX, além de uma marca dentro do setor de transportes, é assustador. Durante o período apelidado por Eric Hobsbawm de Era dos Extremos, muitos acontecimentos ocorreram em uma velocidade absurda, porém, antes do advento do automóvel individual, eram os trens o modo de transporte mais confiável e esta mudança social e cultural que Drygas almeja transmitir com seu documentário.
Segundo Bill Nichols, um dos maiores teóricos sobre o gênero documental, existem 6 grandes tipos de documentários: expositivo, poético, objetivo, reflexivo, performático e participativo. Trens se encaixa principalmente no documentário expositivo, reflexivo e até mesmo poético, ao considerarmos as sensações que a produção passa no retrato das mudanças que a sociedade passou ao longo de um século tão tumultuoso.
Confira abaixo o trailer oficial de Trens e continue lendo a crítica
A primeira cena da produção é a construção de um trem, sendo a última justamente o seu desmantelamento, demonstrando um arco de personagem nítido, um veículo que passou por tanta coisa, e transmite ao longo do documentário, por meio de 46 diferentes arquivos em vídeo, sua verdadeira importância como um símbolo do progresso e de mudança, ao mesmo tempo que transmite uma certa magia e ordenação muito adorada pelo personagem ficcional Sheldon Cooper, protagonista da série The Big Bang Theory (2007, Chuck Lorre) e seu Spin Off Young Sheldon (2017, Chuck Lorre).
Em um episódio, Sheldon explica o motivo pelo seu fascínio por trens, segundo ele, quando criança sua vida era muita caótica, sendo que os trens representam a ordem, um certo sentimento de controle. Acredito que Drygas tenha sentido algo semelhante ao montar o seu documentário, a sensação de alegria se mistura com uma tristeza e uma melancolia trazida pelo contexto do século XX, esta junção de emoções catárticas diferentes, desde uma alegria do público ao assistir uma cena de Charlie Chaplin em que o seu vagabundo sai de um trem, até a agonia em ver pais sendo obrigados a colocar seus filhos em trens e mandá-los para longe, tudo isto auxilia na construção de uma lenta jornada.

Cena de Trens- Divulgação oficial É Tudo Verdade
Trens não é um filme rápido de se assistir, do mesmo modo que uma legítima viagem de trem, a produção apresenta um ritmo lento e cansativo, existem momentos de maior interesse, como a cena de Chaplin ou a aparição de Adolf Hitler, porém, elas se destacam por conta de personagens famosos e conhecidos pelo público, em sua grande maioria, Trens, por bem ou por mal, é um documentário sobre o cidadão comum, aquela pessoa que utilizava diariamente o trem, seja para turismo ou como meio de mobilidade para ir de um lugar ao outro.
Sejam os funcionários que constroem as rodovias, o casal apaixonado dentro do vagão, a mãe cuidando dos filhos, ou somente as pessoas que admiram o meio de transporte tão majestoso, Trens as retrata com imagens de arquivo meticulosamente escolhidas com o intuito narrativo de construir um percurso histórico e social.
O documentário se inicia com uma frase bem propícia de Franz Kafka, uma que descreve com exatidão o século XX: “Existe muita esperança, uma quantidade infinita de esperança, mas, não para nós”. A sentença apresenta um tom melancólico que dita a jornada que o filme aborda. Por meio de um design de som mestre, que conduz toda a narrativa, Trens é uma experiência única de se ver do cinema, caso o espectador consiga relaxar e ser levado na viagem.
Trens será o filme de encerramento de SP do Festival É Tudo Verdade 2025 e passa após a cerimônia de premiação, no dia 12 de Abril, às 20:30 na Cinemateca de SP.
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