Já ouviu falar de Notícias Populares? Pois hoje é dia. Da série, não do jornal. Essa série que é baseada no jornal, já que foi criada pelo jornalista André Barcinski, que de fato trabalhou no Notícias Populares por um ano e meio, e pelo cineasta Marcelo Caetano.
André conta que a ideia de fazer algo baseado no “Notícias Populares” já existe há muito tempo. “Vi no jornal uma escola muito grande de jornalismo cultural.”, diz. “É uma história que me fascina.”
Notícias Populares estreia hoje, dia 29 de setembro, às 22:30. Seu lançamento faz parte dos 25 anos do Canal Brasil, onde a série será exibida. Ao todo, serão sete episódios, lançados toda sexta-feira.
Pra entrar no clima, fique com o trailer:
Notícias Populares – O jornal
O “Notícias Populares”, mais conhecido como NP, foi um jornal de São Paulo. Circulou por quase 38 anos, entre outubro de 1963 e janeiro de 2001. Era conhecido por suas matérias sensacionalistas e escandalosas, que deixavam dúvida se eram verdadeiras ou não. Notícias como “Bebê Diabo” e “Gangue dos palhaços” foram temas do NP. Mas ele também foi precursor e avant-garde em algumas áreas. Foi, por exemplo, o segundo meio de comunicação do Brasil a ter uma coluna LGBTQIAP+. E a tratar pessoas dessa comunidade com respeito. Também havia mais profissionais negros e editoras mulheres do que em outros jornais.
Por ser popular, não era muito bem-visto. Era publicado pelo Grupo Folha, mas sua estrutura estava longe de ser a mesma de outros jornais do grupo. Os computadores, por exemplo, eram todos de segunda-mão. Quase tudo por lá era de segunda mão, aliás. O que a “Folha de São Paulo” não queria mais, enviava para o “Notícias Populares”. Portanto, era um ambiente bem desordenado. Por causa da estrutura, mas também pelo tipo de notícia que cobria. E por sempre receber visitas do público na redação.
É esse ambiente de caos que o espectador poderá ver na série.
Notícias Populares – A série
É início dos anos 90. O “Notícias Populares” está em crise. Vem sofrendo muitas críticas exatamente por seu teor sensacionalista. Para colocar ordem (ou tentar) na loucura que é o NP, chega Paloma. Vinda de Paris, onde trabalhou como correspondente de um dos maiores jornais do Brasil. Seu objetivo – e o que lhe foi prometido – é ficar seis meses no Notícias Populares, organizar a bagunça e ir para a Folha. Mas ela vai ver que não vai ser tão simples assim.
A personagem de Paloma, interpretada por Luciana Paes, não existiu. Ela está ali como uma representação do espectador, jogado aos leões, no meio da desordem que é a redação do NP. Paloma, assim como quem assiste, não sabe como aquele jornal funciona. Ela vem de fora, vem da Europa, não está mais acostumada com o Brasil. Muito menos com o Brasil “de verdade”, o Brasil sem frescura que é o NP. Luciana Paes está no ponto na pele da jornalista. Acostumada a fazer comédia e personagens mais escrachados, que externalizam muito no corpo, a forma como Luciana interpreta o jeito comedido de Paloma faz o espectador sentir junto com ela todo seu incômodo.
Cenografia
Apesar de Paloma não ter existido, grande parte do que se vê na tela é real. Ou foi. Não de forma exata. Até porque a intenção dos criadores não era de documentação, e sim de ficção. Mas muito do que ocorreu no Notícias Populares pode ser visto na série. Como as matérias bizarras. A cada episódio, o espectador se depara com uma das notícias que o jornal realmente publicou. O Bebê-diabo está lá. A Gangue dos Palhaços também. E muitas outras esquisitices.
O que também está lá são vários objetos que existiram na redação. Não o mesmo objeto, mas reproduções. A produção da série teve acesso a um documentário feito dentro da redação do jornal, portanto tiveram muita matéria-prima para reproduzir o cenário tal qual era nos anos 1990. Gravada em dos prédios do jornal Folha de São Paulo, o fato também ajudou a levar o clima do NP para as telas.
Estética e clima
Esse vibe meio trash da série permitiu que produção e elenco abusassem dos exageros. Isso ajuda o espectador que nunca teve contato com o Notícias Populares a entender o que era ler o jornal na época. Chegar na banca de jornal e ler reportagens absurdas. Essa era a intenção do diretor com o tom absurdo e excessivo visto na tela.
Assumidamente com referência de Pedro Almodovar, é possível notar a inspiração nas cores utilizadas tanto em figurinos e cenários, quanto na própria fotografia. Bruna Linzmeyer, que interpreta a personagem Rata, que aparece nos últimos episódios, diz que uma de suas referências foi Andrea Cara Cortada, de Kika, longa do diretor. Ana Flávia Cavalcanti, que dá vida à Greta, colunista social do NP, disse ter aproveitado para atuar um tom mais acima do que está acostumada, o que, segunda ela, foi muito divertido de se fazer.
Aliás, os personagens são um caso à parte e cada um deles poderia virar uma matéria no jornal, de tão interessantes e únicos. Do diretor do jornal ao “foca” (jornalista novato), passando pelos personagens das matérias, todos têm características irreverentes que divertem o espectador. Indo quase para um extremo, um absurdo, meio nonsense, mas conseguindo parar bem no momento que seria demais. Bem no clima do jornal mesmo. Essa é uma das características mais fascinantes da série: valorizar o que se considera ridículo em cada pessoa.
Diversidade
Por falar em personagens, uma curiosidade: para Notícias Populares, houve inscrição online para o elenco. O diretor revelou que acha primordial haver sempre renovação de casting, para não se ter sempre as mesmas pessoas nas produções. “É vital para ter novos rostos surgindo e de locais que não são agenciados. É uma função política até”, afirmou. Por conta disso, o elenco é bastante diverso. E com muitos rostos desconhecidos do grande público e que esbanjam talento.
Outro fato interessante é a troca de atores de seus gêneros audiovisuais mais usuais. Como a já mencionada Luciana Paes, que geralmente faz humor, no papel de uma jornalista muito comedida. Ou Ana Flávia, uma mulher séria e ativista, interpretando uma colunista social escrachada. “Quis fazer a troca de atores para ter um estranhamento. Pegar o sério para fazer o engraçado e o engraçado para fazer o sério”, contou. Foi uma boa escolha porque aumenta ainda mais o impacto do espectador para essa redação tão conturbada.
Enredo
O roteiro é de André Barcinski em parceria com o diretor Marcelo Caetano e, também, Anna Carolina Francisco e Ricardo Grynzpan. Os roteiristas conseguiram deixar a série redonda, sem pontas soltas. E com um equilíbrio perfeito entre comédia, suspense e até um pouco de drama. Há temas que são críticas nem um pouco veladas a alguns assuntos. Mesmo trabalhando com notícias surreais, como um jacaré que come crianças e é apelidado de “jacaré-cocô”, o roteiro consegue tocar em temas de forma leve e divertida, mas que geram análise e discussões. “A discussão crítica se mantém. O politicamente incorreto não deve ser celebrado, e, sim, colocado para discussão.”, afirma Marcelo.
Quanto à pesquisa para a escolha das matérias utilizadas, os roteiristas pesquisaram em mais de mil exemplares do jornal. Além disso, a produção também entrevistou profissionais que trabalharam no NP. Segundo André, há material para fazer ainda mais 5 temporadas. Estamos contando com isso, porque é uma série muito diferente e que deixa o espectador ávido por mais!
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