Intenso, absurdo, insano, desatinado; esses são alguns dos adjetivos que poderiam definir O Nariz ou a Conspiração dos Dissidentes, mas essa animação russa parece se negar a ter uma definição clara. Você lê a sinopse e pensa “uau”, aí você senta pra ver O Nariz e exclama “UAU!!”. Essa animação está além de qualquer outra, é uma cacofonia de informações, referências, personagens, vozes, um excesso construtivista.
Estilo singular
Primeiramente, a história é densa, começa com passageiros num avião comercial que assistem a todo tipo de filme russo. Um passageiro começa a assistir a um desenho sobre a história de Nikolai Gogol, escritor que concebeu O Nariz. Esse livro é a base para a ópera O Nariz, de Dmitri Shostakovitch. Sim, essa montanha nem chega ao começo, mas ao assistir isso se torna irrelevante. A história flui (estranhamente) de forma natural. Do avião para a ópera, da ópera para o Kremlin, do Kremlin de volta para a ópera, e por aí vai.
A animação é uma surpresa a parte, tanto quanto pelos estilos díspares quanto pela criatividade como aquarela, lápis de cor e animação digital são combinadas. Além disso, usaram colagens de revistas, pinturas recortadas, fotografias, ilustrações vitorianas e tanto mais que você não sabe para onde olhar. Felizmente essa bagunça é mesmerizante, você se sente como uma criança numa loja de doces, perdido num mar de joias.
Continuando com as colagens, O Nariz faz menções a tanta coisa que é difícil reconhecer metade, tanto por não termos o mesmo repertório que a audiência russa, quanto pela volume com que tudo é jogado na sua cara. Vemos um mix que vai de pinturas suprematistas de Kazimir Malevich até Ilia Repin; de Guernica até O Encouraçado Potemkin. Sergei Eisenstein faz uma ponta, todoo gabinete Stalinista dos anos 30-40 também, assim como o trem dos irmãos Lumiére.
Unicamente russo
Em suma, O Nariz é confuso a princípio, mas vale a pena, a quarta parede é quebrada de forma única, mostrando os animadores trabalhando no filme. É uma fuga muito bem vinda para o padrão Disney que domina o mercado. Além disso, O Nariz é único, em estilo, em linguagem, e em ideologia. É um mergulho, hora hilário, hora trágico, na cinematografia russa do século 21h e com certeza um dos destaques da 44ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo.
Enfim, veja um vídeo (em inglês) sobre a história de perseguição de Shostakovich:
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