Acaba de estrear nos cinemas, “Setembro 5”, de Tim Fehlbaum. Com uma indicação ao Oscar de melhor roteiro original, o filme aborda o atentado terrorista que ocorreu nos Jogos Olímpicos de Verão de 1972, em Munique, Alemanha, do ponto de vista da cobertura jornalística.
Na ocasião, o grupo terrorista “Setembro Negro”, invadiu a vila olímpica e tomou de refém onze integrantes da equipe olímpica de Israel, entre atletas e treinadores. O evento, conhecido como “Massacre de Munique”, já foi retratado em diversos filmes. O diferencial, aqui, é que ele não é o foco principal da narrativa, mas sim a forma como a imprensa, em especial o setor de cobertura esportiva do canal americano ABC, realizou a cobertura do atentado, em tempo real, algo, até então, inédito, na história do jornalismo.

Ética das imagens em Setembro 5
O filme traz à tona alguns questionamentos em relação a ética das imagens, como quando surge a percepção de que uma cobertura ao vivo poderia acabar transmitindo um assassinato ao vivo. Até que ponto a possibilidade de informar às pessoas é soberana sobre o que é ético, ou não ser exibido ao vivo? Onde começa e onde termina o direito do público a ver todos os fatos?
As imagens, inclusive, atrapalham, em certo momento, quando a cobertura prejudica a abordagem da própria polícia. Afinal, os terroristas também tinham acesso a televisão e acabam vendo a transmissão ao vivo de uma movimentação policial para neutralizá-los. Algo semelhante ao Caso Eloá, ocorrido no Brasil e que terminou de forma trágica.

Detalhes técnicos
Há momentos de crítica mais direta à falta de ética jornalística, como por exemplo, o anúncio de um boato como uma notícia confirmada. Porém, este acaba não parecendo ser o foco do filme. Embora, essas questões apareçam, elas são deixadas de lado muito rapidamente e não são, exatamente, aprofundadas. A impressão geral que fica é que o filme acaba sendo uma espécie de ode meio romantizada sobre a cobertura jornalística, e não uma reflexão sobre ética e imparcialidade.
Embora deixe a desejar na profundidade em como trata o tema, “Setembro 5” é primoroso em representar detalhes técnicos de como funciona uma sala de controle de transmissão ao vivo. Mesmo ambientado, em grande parte, em apenas um único lugar, a sala de controle, em nenhum momento a tensão diminui ou há uma frouxidão no ritmo. Graças, em especial, à uma boa e inteligente montagem que alude o dinamismo complexo de uma cobertura ao vivo.

A distância do terror
Ao acompanharmos o filme, nos sentimos exatamente como os membros da equipe jornalística. A transmissão ao vivo deixou milhares de pessoas na mesma condição em que eles se encontravam: tão perto e tão distante do verdadeiro terror que ocorria. Primeiramente, eles tomam conhecimento ao ouvir barulho de tiros. Durante grande parte do filme, não temos imagens do que acontece. Quando um vislumbre ocorre, ele surge com uma potência aterradora. Uma imagem muito famosa, que muitos já viram: a de um terrorista na varanda do quarto.
O entusiasmo da equipe ao se deparar com uma transmissão ao vivo de algo tão inesperado, como se cada um ali estivesse ganhando a oportunidade de suas vidas pode ser equiparado a forma como as guerras acontecem nessa modernidade. O horror situa-se em uma distância segura para quem apenas é informado sobre ele. Porém, quando ao final, o desfecho trágico, que nenhum personagem, nem espectadores, conseguem ver, ocorre, percebemos que não é preciso ver o terror de perto para sentir suas consequências.

Setembro 5 e o ciclo do ódio
Quando realizou o filme “Munique”, Spielberg não abordou apenas o atentado, mas também a operação realizada pelo serviço secreto israelense como retribuição pelo “Massacre de Munique”. O filme mostra como as ações dos agentes israelenses os colocaram no mesmo patamar do que é considerado terrorismo, contribuindo para um contínuo ciclo do ódio, que chega a um de seus episódios mais sombrios na atual Guerra da Palestina, que acaba de entrar em momento trégua. Uma perspectiva, inclusive, que faz muita falta em “Setembro 5”.
A incapacidade de enxergar o outro e direcionar um ódio (ou desconfiança) generalizada a um povo permeia esses ciclos, sempre presentes em grande parte dos conflitos mundiais, e, também, na narrativa do filme. Isso aparece, por exemplo, quando a personagem de Marianne (Leonie Benesch), que atua como uma tradutora, é alfinetada por ser alemã, em referência a um passado de menos de 30 anos do país, na ocasião. Isso é evidenciado, também, pela menção à falta de seguranças armados na vila olímpica.

Onde assistir
Embora interessante, “Setembro 5” perdeu uma grande oportunidade de promover um debate sobre a responsabilidade da imprensa e um conflito que já se arrasta por décadas, sem nenhum vislumbre de uma resolução pacífica no horizonte. Uma reflexão que seria (e é) extremamente necessária em meio ao processo de trégua de um dos mais sangrentos capítulos do conflito árabe-israelense.
Por fim, o filme acaba de entrar em cartaz nas salas de cinema brasileiras. Por fim, consulte a rede de cinemas de sua cidade para encontrar sessões disponíveis.