Entrevistamos o elenco da peça teatral, “69 Cômodos” que entrou em cartaz no dia 8 de agosto, e continuará até o dia 31, no Teatro Ipanema, às 20 horas. Nela a história mostra que as vidas das pessoas mais simples, podem ter uma profundidade tremenda.
O elenco nos contou fatos importantes sobre a peça como o motivo do nome da vila ser Chora Vinagre, as pautas LGBTQPIA+, e também o processo criativo da criação do roteiro, confira tudo isso a seguir:
Leia abaixo a entrevista com Leá Cunha, atriz do espetáculo:
Você subiu ao palco, falando suas experiências relacionadas a sexualidade e questões raciais, como isso foi para você?
“Não é fácil falar desse dia a dia, do corpo travesti na rua. E expor essa situação dessa minha mudança pra vila Chora Vinagre, que é o ponto central da peça, e explicar o porque da minha mudança… Eu acho, uma posição política importante na luta dos direitos LGBTQPIA+ sabe? E aí eu faço questão mesmo de vir aqui e falar de todo esse movimento, com essa história de negros e negras da vila que é apagada.”
Continuando ela diz: “E aí eu junto essas duas histórias pra gente poder fazer uma só, pra amarrar essa dramaturgia. Porque no início da peça, quando perguntam a dona Édia ‘Por que o nome da vila é Chora Vinagre?’ Ela diz, ‘Não sei, ninguém da vila sabe’. Mas eles não sabem ou não querem falar? Ou não querem saber?”
Como você soube que esse termo era uma punição na época do período colonial?
“Eu soube lendo livros históricos, além disso sou integrante da Casa das Pretas, que é ao lado da vila e do mesmo dono. Lá discutimos muito sobre a história da cidade do Rio, da cidade preta do Rio de Janeiro, que por muitas vezes é oculta.”
Em conclusão ela fala, “E isso não é aberto, isso não se discute no cotidiano. É um choque pra mim toda vez que eu entro na vila e tá lá escrito, “Chora Vinagre”. De cara, eu falei assim, “Que doideira”, porque Chora Vinagre é um castigo, que era pra amansar os pretos e as pretas, e ali na época colonial, era um mercado de fato, de venda de escravizados.
Leia a seguir, a entrevista com Alex Teixeira e Clarisse Zarvos, que atuaram e dirigiram “69 Cômodos”:
Qual a importância para os entrevistados, que viraram personagens, de terem sidos reconhecidos e ganhado valor por vocês?
Clarisse Zarvos, “Acho que tem um lugar de memória mesmo. Pois todo mundo de várias idades, tanto jovens, crianças e idossos, tenham uma questão da memória, de lembrar das suas histórias, e se contar, fora a decisão de o que omitir ou não. Sinto essa troca bastante especial.”
Alex Teixeira, “Eu tenho a ideia de contar a história de uma cidade que não está nos livros. Muitas delas não estão mapeadas, não se encontram na internet, nem ao menos em registros escritos. É uma tentativa de salvar um pouco desse tempo que a gente vive nessa cidade do Rio de Janeiro e nesse Brasil. É um lugar que a gente vive camadas e camadas de apagamento, então o Teatro ao Redor trabalha muito com essa tentativa de contar histórias que não foram contadas ainda.”
Eu tenho certeza que foi uma experiência incrível falar com diversas pessoas que talvez vocês nunca fossem falar na vida. Como foi esses encontros?
Alex, “Eu acho que a coisa mais forte que eu, tenho desse processo, é o fato de que muitas dessas pessoas a gente não sabia que iria encontra, e algumas experiências a gente foi pra, pra determinados espaços como por exemplo na praça do IAPI na Penha, é a gente não tinha nenhuma entrevista marcada lá, nós só fomos e começamos a abordar pessoas e a gente foi super bem recebido. Essas pessoas foram nos contando sobre as vidas delas e pra gente é muito gratificante também perceber que todo mundo tem muitas histórias incríveis, todos nós temos histórias incríveis, independente da idade que a gente tenha, seja uma criança, seja um idoso. O encontro é um sentimento muito forte.”
Clarisse completa, “Além disso, perceber o que tem de extraordinário na vida de todo mundo! Qualquer pessoa tem uma coisa de muito especial, e é muito interessante, que todas as vidas são muito especiais também.”
Como vocês acabaram de falar, as entrevistas foram um pouco as cegas. Falem um pouco de desse processo criativo, não só como atores em cima do palco, mas sim como diretores?
Clarisse, “No início a gente fez mais entrevistas principalmente no Chora Vinagre, a gente editou esses vídeos, é fizemos uma seleção, para começar a construir a dramaturgia. Porem, em um dado momento a gente sentiu necessidade de ter mais entrevistas pelas histórias que iam se conectando. Com isso a gente saiu de novo numa segunda leva de entrevistas, entretanto quando a gente já estava ensaiando as cenas, e o texto já estava pronto, nos fomos pegar umas imagens no ambiente, porém a gente encontrou Leá Cunha, e enfim ela acabou participando. A parte, o roteiro tem sugestão de todo mundo, da Zeza, da Rach, da direção musical e tudo isso vai entrando.”
Alex continua, “Assim como no documentário, que em geral trabalhamos com um roteiro aberto, aqui nos nossos processos de investigações e nas entrevistas, a gente tinha algumas perguntas que eram circunstanciais para essa ida em campo, mas quando a gente chegava, também deixávamos nos atravessar pelo que vinha partir do receptor. Através disso, nós assistíamos e entendíamos como a gente iria fabular em cima dessas histórias que nos foram ofertadas.”
Sinopse de “69 Cômodos”:
A peça de teatro documentário “69 Cômodos” aborda as relações de pessoas comuns com suas casas e com a cidade. Ao longo de dois meses, o grupo Teatro ao Redor percorreu diferentes bairros do Rio de Janeiro e registrou conversas com moradores, como uma imigrante israelense que odeia os cariocas, um ex-compositor da Mangueira, uma criadora de pássaros que participa de rinha de aves, uma senhora que vive há mais de 90 anos na mesma rua e uma criança que sonha em ser atriz de série coreana. O destaque da obra é a fabulação a partir de histórias reais: o cotidiano e a normalidade convivem paralelamente com o absurdo e o inesperado, dentro e fora de quatro paredes.
Ficha Técnica:
Argumento, pesquisa e dramaturgia – Alex Teixeira e Clarisse Zarvos
Direção – Alex Teixeira e Clarisse Zarvos
Elenco – Alex Teixeira, Clarisse Zarvos, Rach Araújo e Zeza Barral
Participação – Leá Cunha
Direção musical – Rach Araújo
Músicas – Genaro da Bahia
Desenho de luz – Lara Cunha
Operação de luz – Bernardo Bastos
Cenografia – Alice Cruz
Assistência de cenografia – Duda Lopes
Figurino – Tiago Ribeiro
Costureira de Cenário – Nice Tramontin
Serralheiro – Djavan Costa
Vídeo – Vitor Kruter
Foto – Thaís Grechi
Direção de produção – Aninha Barros – Uçá Cultural
Design – Alessandra Teixeira
Mídias sociais – Júlia Sarraf – Uçá Cultural
Assessoria de imprensa – Lyvia Rodrigues – Aquela que Divulga
Realização – Teatro ao Redor
Serviço:
69 Cômodos
Local: Teatro Ipanema
Endereço: Rua Prudente de Morais, 824 – Ipanema
Datas: 8 a 31 de agosto – terças, quartas e quintas (exceto dias 10 e 24)
Extras: 29, 30 e 31/08 às 17h
Horário: 20h
Informações: (21) 2523-9794
Instagram: @teatroaoredor?
Duração: 80 min
Gênero: teatro documental
Classificação indicativa: 14 anos
Capacidade: 222 lugares
Ingresso: R$30 (inteira) e R$15 (meia)
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