Quase filme nenhum foi tão brutalmente real quanto “Colectiv”, documentário romeno que está no Festival É Tudo Verdade. Aliás, raras vezes vi algo tão chocante, asqueroso e similar a realidade brasileira, as memórias da Boate Kiss ainda assombram. O longa exemplifica perfeitamente o trabalho do jornal Gazeta Sporturilor e a luta para chegar na verdade, tentando trazer a verdade à tona.
“Colectiv” fala sobre uma tragédia no sistema de saúde, depois de um incêndio numa casa de shows em Bucareste, Romênia. Essa catástrofe se desenrolou exatamente como o incêndio que tivemos em 2013 em Santa Maria, RS. A sinceridade do documentário te transporta para o dentro da ação junto aos jornalistas, aos médicos, e aos sobreviventes. Várias vítimas morreram no hospital por infecções bacterianas contraídas em material cirúrgico e ambientes desinfetados com químicos diluídos.
Paralelos
Como brasileiro, é impossível assistir documentário “Colectiv” sem sentir uma conexão com esse drama romeno. Afinal, temos as mesmas raízes latinas, nossos idiomas são similares, temos os mesmos problemas obtusos com corrupção. A publicação da matéria anticorrupção gerou um forte apoio popular, no Brasil isso (pelo menos agora, nesse mundo pós 2013) não aconteceria. Além de discutir sobre corrupção e sobre mudança, o jornal usou a sua plataforma para resistir. Onde que um jornal esportivo brasileiro hoje escreve sobre algo além do pão e circo que é entregue diariamente nas bancas?
Ainda mais, apesar das similaridades ainda vemos muitas diferenças entre as realidades brasileira e romena. Somos todo humanos; somos todos capazes de nos levantar, protestar e mudar algo que é fundamentalmente injusto. Então o que cria esse entre a Romênia e o Brasil? Por que quando o povo brasileiro se uniu para lutar por um ideal, acabamos desencadeando o inferno na terra?
Em suma, a nossa sociedade está cimentada na desigualdade. Não é impossível, mas num país menor, seria mais fácil trazer uma mudança significativa. Essa afirmação é uma desculpa que justifica a conformidade com este caos. O Brasil é um país continental, formado por povos muitos distintos que se unem por uma bandeira que não nos representa. O verde do Bragança e o amarelo dos Habsburgo são tão brasileiros quanto hot dog e bombardeio no Iraque.
Finalmentes
Retornando ao “Colectiv”, o incêndio foi o início de um movimento popular que derrubou o ministro da saúde no bolso da indústria química. O ministro interino “Oi, sou Vlad” demonstrou vontade de trazer mudanças, mas ficou limitado na politicagem do sistema. Ele tenta fazer o que é certo, chega até a azer algumas mudanças mas no fim perder a vaga para a oposição. Nesse momento as semelhanças reaparecem, nós elegemos partidos progressistas mas eles continuam a ser tolhidos pelos status quo.
Em conclusão, “Colectiv” é um relato da luta diária da imprensa contra a desinformação. Um documentário que alerta quanto ao tratamento que sofremos dos governos. Além de ser um filme intenso e belo, “Colectiv” é uma escola do bom jornalismo investigativo, a favor do que é correto.
A saber, para ver o filme acesse o site do festival no dia 25/09 às 18h.
Afinal, veja o trailer:
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