Luciano Carneiro – Fotojornalismo e reportagem. Em sua breve e profícua carreira como fotojornalista, o cearense Luciano Carneiro (1926-1959) documentou eventos históricos que marcaram a década de 1950, como a Guerra da Coreia e a Revolução Cubana. Além disso, também produziu grandes reportagens sobre aspectos da realidade brasileira, de conflitos fundiários a atos estudantis. Sua obra é tema de um novo livro, publicado pelo Instituto Moreira Salles em parceria com a Fundação Demócrito Rocha.
A saber, a publicação Luciano Carneiro – Fotojornalismo e reportagem (1942-1959) ganha lançamento no dia 22 de outubro (quinta-feira), às 18h, em uma live no YouTube do IMS. Inicialmente, haverá uma fala institucional com os organizadores do projeto. Em seguida, tem um debate com Sergio Burgi, coordenador de Fotografia do IMS e organizador do livro, a historiadora Erika Zerwes e os fotógrafos Tiago Santana e Victor Moriyama. Ainda por cima, tendo a obra de Carneiro como ponto de partida, eles debaterão o tema: “Imagem e engajamento: o fotojornalismo humanista da década de 1950 e a fotografia documental contemporânea”. A conversa rola ao vivo no YouTube do IMS.
A vida de Luciano Carneiro
Inicialmente, nascido em Fortaleza em 1926, Luciano Carneiro teve uma trajetória rápida e abrangente. Aos 16 anos, iniciou sua carreira no Correio do Ceará. Posteriormente, em 1948, ingressou na revista O Cruzeiro, no Rio de Janeiro, onde se consagrou como fotojornalista. Além de produzir as imagens, muitas vezes assinava os textos das matérias. Ao longo de 11 anos de atividade na revista, cobriu temas brasileiros e internacionais, viajando do Japão à União Soviética, do Egito de Nasser à Iugoslávia de Tito. Em 1959, aos 33 anos, sua trajetória foi interrompida bruscamente, quando faleceu em um acidente de avião, no retorno de um trabalho em Brasília.
A princípio, este livro é o primeiro a percorrer de forma abrangente a carreira e obra de Carneiro, cujo acervo está, em parte, sob a guarda do IMS. A publicação reúne mais de 170 imagens e cerca de 35 matérias. Também apresenta uma cronologia detalhada da vida do fotógrafo. O material exibido no livro provém do acervo de Carneiro e dos arquivos da revista O Cruzeiro, hoje parte do acervo do jornal Estado de Minas.
Na equipe de O Cruzeiro, Carneiro atuava ao lado de uma nova geração de fotógrafos, como José Medeiros, Flávio Damm e Henri Ballot. Inspirados no chamado fotojornalismo humanista, que surge no pós-guerra com nomes como Robert Capa e Henri Cartier-Bresson, buscavam construir narrativas críticas, com o teor autoral e engajado com as questões sociais.
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Polarização
Foi com essa perspectiva, em um contexto de Guerra Fria marcado pela polarização, que Carneiro rodou o mundo. Uma de suas principais coberturas – que ganha destaque no livro – foi a da Guerra da Coreia. Posteriormente, em 1951, conseguiu obter credenciais para entrar no país, tornando-se, com apenas 25 anos, um dos únicos repórteres sul-americanos a cobrir o conflito. Carneiro publicou um total de 10 matérias sobre a guerra. Fotografou Seul destruída, acompanhou tropas turcas e colombianas, retratou militares feridos, prisioneiros de guerra e civis em fuga. Também foi um dos quatro correspondentes que saltou de paraquedas ao lado do exército americano sobre as linhas inimigas na Coreia do Norte.
Em seguida, a publicação também destaca a cobertura da Revolução Cubana. No início de 1959, Carneiro acompanhou os momentos finais da queda do regime de Fulgêncio Batista. O fotógrafo documentou a entrada de Fidel Castro em Havana, entrevistando o líder revolucionário e outros dirigentes. Além disso, também testemunhou os julgamentos e fuzilamentos de oficiais da repressão do antigo regime. Em maio de 1959, registrou a visita de Castro a Brasília, onde o líder cubano foi recebido por Juscelino Kubitschek.
URSS
Outro marco de sua carreira – presente no livro – é a série de reportagens produzidas na União Soviética, em 1957. Após ter seu visto negado várias vezes, Carneiro conseguiu finalmente entrar no país, onde registrou a cultura e o cotidiano de Moscou, com destaque para temas como a presença das mulheres nos postos de trabalho, a valorização da ciência, além do registro das paradas militares. Em suas viagens pelo mundo, entre 1954 e 1956, documentou ainda o Egito pós-revolução, presidido por Muhammad Naguib e Gamal Abdel Nasser.
Com sua câmera, também rodou o Brasil, captando as tensões e contradições que marcavam o país em um momento de modernização. Uma das principais reportagens dessa época é sobre a revolta dos posseiros de Formoso e Trombas em Goiás, em 1957. Carneiro registrou as atividades políticas do líder da rebelião, José Porfírio de Souza, agricultor que viria a ser perseguido pelo regime militar após 1964, tornando-se um dos desaparecidos políticos do período.
Lentes
Por fim, no Rio de Janeiro, acompanhou a luta dos estudantes por melhores condições de ensino e documentou eventos cotidianos, como os desfiles de Carnaval e as partidas de futebol. Contudo, as heranças do cangaço e a seca do Nordeste, entre tantos outros temas, também foram captadas pela câmera do fotógrafo em sua curta, porém consagrada, trajetória.
Afinal, com o lançamento de Luciano Carneiro – Fotojornalismo e reportagem, o IMS, a Secretaria de Cultura do Estado do Ceará e a Fundação Demócrito Rocha reforçam a importância do legado de Carneiro para o fotojornalismo brasileiro. Um profissional aficionado, sobretudo, por sua prática, como afirma em suas próprias palavras:
“Meu Deus, a vida é tão rica de sugestões, há tanta poesia perdida até no meio da rua, que basta a gente manter os olhos abertos, e a máquina pronta, para selecionar as imagens que tenham significação, e assim interpretar a vida. Eis a fórmula. O resultado, este depende da sensibilidade e da experiência do homem que fica por trás das lentes.”
Sobre o acervo de Luciano Carneiro
Em 2012, o Instituto Moreira Salles adquiriu da família de Luciano Carneiro seu acervo fotográfico. A coleção tinha por 136 cópias ampliadas de fotografias. Em 2016, um segundo conjunto de imagens da família do fotógrafo somou-se ao primeiro. Neste mesmo ano, sua obra foi tema da exposição Do arquivo de um correspondente estrangeiro: fotografias de Luciano Carneiro, exibida nas sedes de São Paulo e de Poços de Caldas. Em 2018, o IMS organizou a mostra Luciano Carneiro. Em seguida, entre 2018 e 2020, os pesquisadores do IMS revisaram toda a obra de Carneiro reunida no arquivo da revista O Cruzeiro, sob a guarda do jornal Estado de Minas. Enfim, desse intenso processo de exploração e curadoria, surgiu a presente publicação, resultado das pesquisas realizadas em mais de 20 mil imagens produzidas pelo fotógrafo em sua carreira.
Serviço:
Live de lançamento do livro Luciano Carneiro – Fotojornalismo e reportagem
Debate com Sergio Burgi, Erika Zerwes, Tiago Santana e Victor Moriyama
22 de outubro (quinta-feira), às 18h
Enfim, ao vivo no YouTube do IMS: youtube.com/user/imoreirasalles
Luciano Carneiro – Fotojornalismo e reportagem (1942-1959)
Organização: Sergio Burgi
São Paulo: IMS/FDR, 2020
256 pp.
ISBN 978-65-88251-00-3
R$ 129,50