Coronation, do artista chinês Ai Weiwei, é um esforço coletivo de documentar a crise do coronavírus através das visões individuais de 14 cidadãos que se viram na região de Wuhan. O filme está disponível para streaming na 44ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, custando R$6,00 e com vagas limitadas. Cobrindo viagens, rotinas de médicos e outros trabalhadores, funerais e mais, Coronation choca e assusta.
Como é de se esperar de Weiwei, a mensagem do filme não se resume a um “olha essa desgraça”. O ethos é mais um mergulho na moralidade, tradições e regras da China contemporânea do que uma exposição objetiva da pandemia. Dessa forma, a discussão do Covid é quase secundário frente a oposição ferrenha que o diretor apresenta contra o regime autoritário. Ainda mais, o trabalho de Weiwei é uma colagem peculiar, o mesmo está em exílio na Europa e acabou dirigindo e produzindo o filme a distância. Essa distância pode ter sido insinuada na forma como a câmera flutua incorpórea em várias cenas.
Ideologia e subtexto
As cenas são filmadas impessoalmente, raramente o câmera é visto; um espectro que paira seguindo e acompanhando os dramas de alguém preso em Wuhan. Por outro lado, quando a câmera encarna num narrador, nós vemos uma mudança drástica dessa impessoalidade; um professor vai visitar sua mãe e a indaga sobre vários assuntos. Assim, essas provocações são um reflexo das opiniões de Weiwei, Coronation é um ataque ao governo e uma provocação aos seus ideais. A discussão entre mãe e filho se prolonga, focando nas convicções da mãe e na sua mentalidade ultra fiel ao partido e ofensiva a “mensagens ruins”, ela procura focar em “boas notícias”. Recentemente que essa mentalidade se popularizou, tratando ideais honestos e realismo como culpados de torcer contra e carregar energia negativa. Assim o negacionismo se apresenta, mais próximo do que podemos imaginar.
Em suma, Ai Weiwei fez um filme que vai além das manchetes alarmistas de “China maligna” e “China salvadora controla epidemia”; Coronation se encontra bem no meio, na zona cinzenta, onde a verdade é ocultada e a pandemia tratada com a seriedade que merece. Finalmente, o longa é bruto e eficiente, da mesma forma como o governo chinês cuida da pandemia.
Enfim, veja o trailer:
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