Vampiros são motivo de temor? Ou de piada? No filme “A Dança dos Vampiros“, há uma combinação de ambos. Em 1967, o notável diretor Roman Polanski realizou um de seus filmes mais subestimados – e também um dos mais geniais. O filme é uma homenagem aos filmes de terror B, mas de uma forma ácida e irônica que somente Polanski poderia fazer. Faz uma mistura de gêneros como terror, comédia, aventura e romance. Mas tudo feito na dose certa, e com um toque de humor negro bem característico do diretor.
Os personagens certas vezes agem até de forma absurda e grotesca. Uma característica de alguns curtas do início de carreira de Polanski, como “Dois homens e um Armário” (1958) e “O Gordo e o Magro” (1961). O longa-metragem conta a história do atrapalhado professor Abronsius (Jack MacGowran) e seu tímido assistente Alfred (o próprio Polanski) em uma busca pelo vampiro Conde von Krolock (Ferdy Mayne). Os dois protagonistas, assim como muitos personagens de filmes de Polanski, parecem patéticas criaturas que tentam em vão mudar seu destino ou algum acontecimento. Muitas de suas ações parecem inúteis, mas seguem sempre em frente, sugando de forças de algo que lhes motiva: para o professor, a vontade de provar aos colegas que o chamavam de caduco que ele estava certo, e para Alfred, proteger a garota que ele se apaixonou (Sharon Tate).
Otimismo a todo custo
Essa ambiguidade de seus personagens serem otimistas a todo custo, mesmo com tantas adversidades aparece em vários dos filmes de Polanski e refletem seu caráter. Quando muito jovem esteve em um campo de concentração na Polônia. Ele e seu pai sobreviveram, mas perdeu a mãe. Aos 6 anos de idade, ele já sabia o que era perder as esperanças mas lutar por uma fagulha de otimismo para sobreviver. Apesar disso, muitos de seus personagens parecem fadados ao fracasso como no filme em questão, e outros como “Armadilha do destino” (1966), “O Bebê de Rosemary” (1968), “Chinatown” (1974), “Tess” (1979), “Piratas” (1986), “O Último Portal” (1999), entre outros.
Apesar de seguir fielmente o professor, eles nem sempre estão na mesma sintonia. O professor é um senhor que de tão obcecado por vampiros, nunca teve tempo para assuntos sentimentais (segundo ele mesmo). Alfred é um jovem na flor da idade, cheio de desejo, e que se interessa por uma moça logo no início do filme, e logo depois por Sarah. A forma inesperada pela qual ele se encanta por ela, reflete Polanski que não queria a atriz Sharon Tate para seu filme, mas que se apaixonou, assim que a conheceu, e casaram logo em seguida. Dois anos depois ela seria assassinada grávida pela seita de Charles Manson. Ironicamente, o personagem que mais parece realmente interessado em concretizar algo com Alfred e chega a investir nele, é o vampiro, filho do conde.
Desconstruindo clichês
Há diversas ironias e desconstrução de clichês em relação aos vampiros: o vampiro Herbert von Krolock (Iain Quarrier), filho do conde, é um vampiro homossexual, que se apaixona por Alfred e o aldeão Shagal (Alfie Bass) é transformado em vampiro pelo conde, mas como ele é judeu, mostrar a cruz a ele não tem efeito nenhum.
Também como ponto alto do filme estão a bela fotografia de Douglas Slocombe, os cenários e a bela música de Krzysztof Komeda, que trabalhava com Polanski desde “A Faca na Água” (1962). Há até uma bela cena de baile coreografado no final do filme (por isso o título em português).
Problemas de produção
Esse foi o primeiro filme de Polanski para um grande estúdio (MGM) e com largo orçamento, o que lhe rendeu muitas dores de cabeça, como mudanças repentinas de locação e atrasos de filmagens. Além disso, a MGM quando lançou o filme nos EUA, resolveu colocar no início do filme uma abertura em animação, sem a autorização dele, talvez para tentar vender o filme como uma comédia familiar. Polanski detestou isso.
Enfim, um filme que sintetiza perfeitamente a visão que Polanski tem da vida, do mundo e da sua arte. Se muitos consideram “O Pianista” (2002) como seu filme mais pessoal. “A Dança dos Vampiros” é seu filme mais autoral.