Sei que desde sempre, o povo cabo-verdiano enfrentou grandes desassossegos e preocupações, motivos pelo quais nosso pequeno arquipélago de dez ilhas encontrou na música e na dança uma forma de aliviar as suas tensões e lutar contra o desânimo. A familiarização com a música desde a infância faz parte da nossa cultura, contudo, nessa fase da vida, não é possível distinguir os géneros musicais presentes no nosso quotidiano. Com o passar do tempo essa distinção torna-se cada vez mais nítida, apercebemo-nos aí o quão diversificado e rico é o leque musical Cabo-verdiano.
No domínio musical, a Morna é um autêntico símbolo nacional de Cabo Verde.
Composta em crioulo, a Morna representa ao mesmo tempo poesia, canção e dança – a expressão do seu lirismo.
Segundo David Hopffer Almada “A morna, em especial, nas suas letras e melodias, tenta fazer um retrato psicológico do ilhéu no seu eterno relacionamento com o ecossistema que o rodeia, com contingência sempre eminente de ter que deixar o pedaço de ilhéu onde se viu nascer e onde viu germinar o amor pela cretcheu e sabendo, ter que deixá-la.”(Apontamentos do livro: “Introdução à cultura cabo-verdiana” de João Lopes Filho).
Contudo não podemos falar de Morna, sem falar de Cesária Évora, a Diva dos pés descalços. Mulher que levou a nossa Morna aos quatro cantos do mundo. Contributo essencial para que Cabo Verde tenha tido o reconhecimento da UNESCO relativamente à Morna enquanto Património Imaterial da Humanidade (dezembro de 2019). Para mim, e acredito que para os restantes cabo-verdianos, esta distinção representa o mais elevado prestígio enquanto manifestação da nossa cultura. Mas é preciso manter o legado e são vários os artistas que demostram vontade em perpetuar essa herança musical. Um bom exemplo é Donna La Perle, artista Cabo-Verdiana natural da ilha do Fogo. Com a sua voz clara, limpa e cristalina, Donna desperta em nós a Morabeza que a
Morna carrega.
Deixo-vos aqui um pequeno concerto da artista!
*Vandira Rodrigues (@almakriola) é cabo-verdiana e jornalista