Cultura
O caso Romero Britto | Justiça ou vandalismo? Um caminho perigoso
Publicado
3 anos atrásem
Por
Luciano Bugarin
Recentemente um vídeo que viralizou deixou muitas pessoas animadas e empolgadas. Mostra uma mulher que vai à loja do artista plástico Romero Britto, reclama e joga uma peça dele no chão. A mulher é a empresária venezuelana Madelyne Sanchez, dona de um restaurante chamado “Olé Olé And Tapelia”, que seria localizado em frente a uma galeria de Romero. Ela teria ido tirar satisfação com o artista pelo fato do mesmo ter ido em seu restaurante e destratado seus funcionários. Ela leva uma peça avaliada em 26 mil reais que foi presente de seu marido. Depois de dizer em alto e bom som todo seu desabafo joga a peça no chão, com Romero tentando inutilmente detê-la.
A princípio, confesso que até agora não consegui entender o motivo de tamanha euforia e comemoração deste ato. Ao meu ver surgem duas vertentes de pensamento das pessoas (a maioria). Algumas estão comemorando este ocorrido e consideram a empresária Madelyne uma verdadeira heroína dos tempos atuais. Em seguida, há também o questionamento do valor artístico da obra de Romero e seu caráter supostamente arrogante.
Arte como mercadoria é arte?
A princípio, todo mundo já viu ou pelo menos sabe como é o estilo da obra de Romero Britto. Em geral, desenhos muito coloridos, de formas fáceis e que se adaptam a qualquer produto que possa ser vendido. Temos canecas, jogos, vai de panos de prato a esculturas de porcelana. Aparentemente, sua obra tem claramente uma proposta de ser de produção industrial. Feita para vender e decorar as casas das pessoas. A saber, Romero ficou muito rico com isso e é muito badalado nos Estados Unidos. Inclusive, é admirado por diversas celebridades, tanto artísticas quanto da política. Mas a obra dele realmente é arte?
Decerto, sempre senti uma coisa meio mal resolvida dos brasileiros em geral com ele. Parece que ou as pessoas amam ou odeiam do fundo de suas almas o artista pernambucano e sua obra. Estudei na Escola de Belas Artes da UFRJ e não lembro de ter conhecido uma única pessoa lá que admirasse o trabalho dele. Aliás, eu mesmo, particularmente, não admiro. Mas por outro lado, também não demonizo como muitos fazem.
Pop Art
Não é de agora que a arte é feita como mercadoria para consumo. Desde que a Pop Art apresentou a cultura pop do século XX, vem crescendo cada vez mais o consumo desenfreado por arte pop. São blusas e bonecos, jogos, revistas, pôsteres, luminárias, chinelos, entre outros, sendo muitos de qualidade e originalidade duvidosa.
Porém, não se pensa nisso quando se gasta uma quantia alta para comprar um balde de pipoca da saga “Star Wars”, ou uma luminária do “Super Mario Bros.”. Ou uma daquelas blusas que aparece a pintora mexicana Frida Kahlo, com uma blusa da dupla francesa de música eletrônica Daft Punk. Aliás, será que as pessoas realmente acham que Frida, se hoje viva, faria uma série de blusas suas para vender como água? Esse é o valor artístico e cultural da arte hoje em dia?
Quem aponta Romero como um não artista apoia-se numa visão negativa por supostamente o comércio destruir a qualidade artística de uma obra. Contudo, consomem sem problemas as obras de outras pessoas que também produzem em escala industrial. É inegável dizer que ele criou um estilo próprio. É impossível ver uma de suas obras e não perceber sua autoria. Se há relevância cultural, acredito que é algo que o próprio artista nunca se preocupou em realizar. Sua proposta sempre foi essa desde o início: a arte como mercadoria.
Justiça ou vandalismo?
Em relação ao segundo ponto levantando chega-se ao motivo pelo qual Madelyne quebrou a escultura. Segundo ela, Romero foi ao seu restaurante e foi muito rude e grosseiro com os funcionários. Não é de hoje que o temperamento do artista é mencionado. Muitas pessoas já falaram publicamente que o artista é arrogante.
Entretanto, após ver o vídeo, me questiono muito ainda. Será que o ato de Madelyne foi mais para defender a honra de seus funcionários ou motivado por um orgulho próprio?Sendo assim, a defesa da honra de seus funcionários acabou vindo por consequência. No vídeo ela faz questão de dizer que adorava ele e que o colocava no pedestal. Ela diz isso duas vezes. Porque idealizar um artista? Colocar ele em um pedestal?
Muitos fãs criam uma visão idealizada de seus ídolos e acabam desapontados quando o conhecem pessoalmente. Por exemplo, quando Groucho Marx conheceu Charles Chaplin e não o achou tão engraçado. Posteriormente, em um vídeo, Madelyne diz que a equipe do restaurante preparou tudo como muito carinho especial para receber Romero e seus convidados. Contudo, será que fizeram além do que fazem por ele ser quem ele é? Muitos artistas que são arrogantes por natureza exacerbam esta arrogância porque os fãs continuam alimentando esse delírio de que eles são as pessoas mais importantes do planeta.
O que Madelyne fez foi justiça ou foi vandalismo?
Ataques à arte
Ao longo da história, diversas obras de arte sofreram vandalismo por inúmeros motivos:
– Um quadro de Renoir no MASP, em São Paulo, foi vandalizado por uma desenhista que jogou tinta nele. Ela disse que precisava divulgar o fim do mundo.
– “A Ronda Noturna” de Rembrandt levou uma facada e teve ácido jogado. Ambos pela mesma pessoa.
– A obra “The Tree”, do artista americano Paul McCarthy sofreu em Paris por lembrar a forma de um brinquedo erótico. A obra era uma estrutura inflável na rua.
– O “Davi” de Michelangelo sofreu uma martelada de um artista italiano.
– A “Virgem Maria” de Chris Ofili sofreu vandalismo por supostamente ferir a fé católica. Representava a Santa Maria como negra, com seio de fora e rodeada de genitálias femininas.
– O “Cristo de São João da Cruz” de Salvador Dalí foi vandalizado com um tijolo, por supostamente também ferir a fé católica ao representar Cristo olhando para baixo e não para cima.
– Inclusive, até a famosa “Mona Lisa” já sofreu ataques com ácido, pedra e spray em diversas ocasiões.
Claro que todos esses exemplos não são para equiparar a importância da obra de Romero com as que citei. Mas sim para que pensemos na seguinte situação: se normalizamos o fato de que sempre que um artista ou qualquer outra pessoa for arrogante conosco ou alguém que conhecemos isso ser motivo para vandalizar sua obra ou produção, estaremos abrindo um precedente para que se vandalize por outros motivos não tão louváveis.
Queermuseu
Aliás, quem lembra do recente episódio de ódio contra a exposição do “Queermuseu”? E se as pessoas que estavam atacando as obras decidissem fazer “justiça” e vandalizar as obras? Na cabeça delas aquilo seria o certo. Já tivemos diversos casos de artistas ameaçados e obras vandalizadas ou retiradas por gerar controvérsia. Quando o atual presidente assumiu seu mandato, a primeira-dama mandou retirar do Palácio do Planalto a obra “Orixás” da artista plástica Djanira. Além disso, a última vez que isso ocorreu foi no governo de Ernesto Geisel, penúltimo presidente da ditadura militar. Não vamos dar mais munição e motivos para que isso aumente ou continue.
Indubitavelmente, é extremamente preocupante quando artistas comemoram a destruição da obra de outro artista. Afinal, isso pode abrir precedentes para pessoas extremamente radicais agirem contra quem aplaude esse gesto hoje, em um futuro próximo. Certamente, vivemos um momento em que a arte está cada vez mais sufocada e subordinada ao “bom comportamento”.
Ademais, veja mais sobre arte:
Arte não encomendada? | Bansky, Sacha Baron Cohen, Doralyce, Bia Ferreira e a GloboNews
Em seguida, leia a crítica de “Cézanne e Eu”
Por fim, conheça Ana Catão | A dança como arte
Professor de artes e cineasta independente. Sou cinéfilo, fã de Simpsons, entusiasta de artes que fogem do óbvio e músicas barulhentas.

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6 Comments
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Cultura
Mulheres. Somos assim! O Musical | Espetáculo tem entrada gratuita
Musical ganha apresentação no Galpão da Seropec com entrada gratuita
Publicado
19 horas atrásem
21 de março de 2023Por
Redação
Com coreografia e direção do artista e bailarino Ronaldo Damas, espetáculo retrata o universo feminino
No dia 29 de março, quarta-feira, às 17h, o Musical Mulheres. Somos assim! ganha apresentação no Galpão da Seropec, em Santa Sofia, Seropédica. A inspiração do espetáculo é na MPB e tem entrada gratuita, com limitação de vagas.
Dirigido e coreografado pelo bailarino Ronaldo Damas, o musical conta com bailarinas do Projeto Dança Fazendo Mudanças, gerido pelo próprio Ronaldo. Para ele, mirar no universo feminino é fortalecer lutas e desafios das mulheres pelo direito igualitário de exercerem o melhor de suas habilidades.
Afinal, para saber como assistir, entre em contato com (22) 98751-7318.
Serviço:
Musical Mulheres. Somos assim!
Dia: 29 de março – quarta-feira
Horário: às 17h
Entrada: gratuita
Local: Centro de Distribuição Seropec
Endereço: Rua C – QD 7 LT 1 Loteamento Vivendas da Flórida Boa Esperança, Seropédica.
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Márcia
25 de agosto de 2020 at 15:16
Concordo 100%.. na minha cartilha de viver bem, não entram idealizações de qualquer tipo, desde pessoas próximas e mais ainda das públicas.
Luciano Dantas
26 de agosto de 2020 at 09:47
Realmente. As vezes esquecemos que pessoas públicas também são pessoas que podem ter os mesmos defeitos que qualquer outro.
JUREMA APARECIDA NOGUEIRA GONCALVES
25 de agosto de 2020 at 22:44
Eu acho que no caso do Romero Brito, os brasileiros que aplaudiram Madelyne, não consideram o mesmo um artista. Esta é a questão que nenhum jornalista quer comentar. Năo é o fato de alguém destruir a obra de um artista porque ele é arrogante, desrespeitoso com o próximo e ainda se achar a última bolachinha do pacote, que aliás sempre está quebrada! O jornalismo brasileiro, precisa deixar de ser hipócrita e o povo também, admitindo que a maioria dos brasileiros não gostam do trabalho dele e nem o consideram um artista, simples assim!
Luciano Dantas
26 de agosto de 2020 at 09:47
Mas isto é dito no texto. Porém acredito ser perigoso aplaudir a destruição de uma obra apenas por não considerar o autor um artista ou detestar sua obra. Pois gosto é uma questão particular e como dito abre precedentes.
Pikareta
31 de agosto de 2020 at 22:59
Mesmo pelos argumentos parciais da dona do restaurante achei ela mais arrogantedo que Romero.Ou tinham outros motivos mais fortes.Pela minha cultura no meu país o ato dela éimpensavel.
Luciano Dantas
4 de setembro de 2020 at 17:14
Realmente. Pareceu-me uma batalha de egos que acabou de uma forma estranha.