“Piedade”, filme dirigido por Claudio Assis, apresenta uma história que já não é incomum dentro da cosmologia brasileira. Ou seja, empresas colossais comprando e destituindo pequenos donos de terra em nome de lucro maior e mais fácil. Com um elenco incluindo Irandhir Santos, Matheus Nachtergaele, Cauã Reymond, Fernanda Montenegro e outros, “Piedade” se baseia em dois “núcleos” familiares desconectados e um executivo da empresa petrolífera chamada Petrogreen (sic) para amarrar essas duas pontas soltas.
Plot e temas
Dona Carminha (Fernanda Montenegro) e Omar (Irandhir Santos) são donos de um terreno e bar na beira da praia, junto de outros personagens ribeirinhos e familiares que não são muito relevantes para a trama. Sandro (Cauã Reymond) junto com o filho é dono de um cinema pornô/motel no que parece ser a capital Pernambucana. Caminhando e entrelaçando esses dois grupos de personagens está Aurélio (Matheus Nachtergaele), um funcionário de Petrogreen responsável pela negociação com os donos do terreno.
A história é simples, o terreno é de interesse de uma corporação sem rosto que fala através de um enviado carismático, Aurélio, que está cavucando em busca de algo que lhe ajude a cumprir o seu objetivo. Essa família e esse dono de “morredouro” estão no seu caminho, fazendo assim uma resistência cansativa para algo que seria relativamente simples.
Acanhadamente, “Piedade” acaba entrando nos méritos desse tipo de business, como quem diz “ó, isso aí não está certo não”. De certa forma, parece ser um ataque direto contra a petrolífera real brasileira, a Petrobrás. Essa esbofeteada artística pode ter algum motivo sério e tangível por trás. Entretanto, esse tipo de fofoca está longe das minhas ambições neste texto, apenas apontá-la já é o suficiente.
Personagens e motivações
Ainda assim, essa construção dos personagens como vítima e da empresa como predadora é interessante de comentar. Afinal, a indústria do petróleo no Brasil é uma das que mais poluem e mais empregam, gerando assim um certo paradoxo onde se pode criticar, mas não muito. Aqui, a poluição direta e indireta é deixada de lado, enquanto se fala principalmente de como as empresas lidam diretamente com as pessoas que estão sob a influência das suas vontades e caprichos. Esse tipo de exposição realmente entra na mente de quem assiste e acaba criando alguns preconceitos, sejam eles justos ou não.
Agora, a história: é fraca e relativamente comum, em nenhum momento é possível se sentir surpreso, talvez só com as cenas mais carnais e explicitas, mas isso se dá mais pelo design de produção do que por qualquer outra coisa. Existe um arco secundário com o filho de Sandro que é meio sem nexo e que não é forte o suficiente para ser mais relevante do que o drama central, mas pelo menos ele se amarra de alguma forma com a história. A mesma ideia de um mini arco se repete com o sobrinho de Omar, que está severamente unidimensional e com basicamente nenhum envolvimento na trama central além de ser um acessório no roteiro.
Chances perdidas
Em termos de personagens, Omar (Santos) é o mais complexo e com uma motivação mais clara. A atuação de Irandhir também é a mais crível e consistente junto com Nachtergaele. Infelizmente, Fernanda Montenegro está claramente subutilizada, sendo responsável por poucas cenas de diálogo, que na sua maioria são repetitivos na carga dramática e nos assuntos. Aparentemente, o mesmo se repete para quase todas as outras personagens, sendo Sandro (Reymond) o mais notável nessa constância monocórdia de emoções. Se a história parece ter recebido pouca atenção da produção, a atuação recebeu ainda menos.
Por fim, “Piedade” é um filme que chama atenção mais pelos excessos visuais e pelos nomes no elenco do que pela história e atuação. Por motivos puramente técnicos, falta uma coesão e melhor conceituação da direção, assim como uma amarração melhor das motivações e atuações. A parte do filme sobre conscientizar a população dos abusos contra o meio ambiente é sólida, mas o resto se perde em rixas de poder e joguetes emocionais pouco desenvolvidos.