“Amor, Sublime Amor”, o novo filme do Spielberg. Chamado de “West Side Story” lá fora, esse filme conta a história de Romeu e Julieta, mas recontextualizada para as tensões raciais na Nova York dos anos 50. A guerra entre gangues de jovens brancos e porto-riquenhos substitui a cisma entre Montecchios e Capuletos. Pode parecer um plot meio bagunçado, mas esse roteiro tem funcionado lindamente desde a primeira montagem dessa peça em 1957.
Uma nova adaptação
Para começar, não tem como discutir a versão de 2021 de “Amor, Sublime Amor” sem comparar com a versão de 1961. Como um todo, o filme novo é mais refinado, em todos os aspectos; mesmo levando em consideração as limitações técnicas e culturais dos anos 60. Além disso, o filme tem um arco narrativo mais amarrado, com tudo, da atuação até o roteiro, muito mais natural. Falar assim de um dos musicais mais clássicos de Hollywood pode ser controverso, mas “Amor, Sublime Amor” do Spielberg é melhor. Algumas mudanças pequenas no roteiro foram feitas, o que é inevitável, mas todas parecem elevar positivamente estrutura do longa.
Sim, “Amor, Sublime Amor” de 2021 é proposital e felizmente mais complexo do que o filme original. A partir do ponto em que o filme como um todo é mais “fílmico” ao invés de teatral, toda a narrativa recebe um trabalho mais dinâmico e menos episódico, possibilitando uma fluidez mais contemporânea. A própria evolução tecnológica das câmeras e da linguagem cinematográfica ajuda nesse ponto. Os personagens estão menos estáticos, não mais presos em planos rígidos e cenários “baratos”, mas sim livres para se movimentar, cantar e dançar numa Nova York recriada, belíssima e colorida.
A história e o social
Levando em consideração toda a questão social, já que vivemos em um momento drasticamente mais polarizado e violento contra as minorias, “Amor, Sublime Amor”. Com isso, o roteiro precisou de um update, principalmente sendo mais sensível as nuances que regem toda a política atual. Resumindo, “Amor, Sublime Amor” de 2021 é bem menos problemático, principalmente com a representação belíssima do elenco e de todos os extras. Menos black e brown face, mais representatividade.
Falando em representatividade, além de humanizar e aproximar mais a audiência aos porto-riquenhos, “Amor, Sublime Amor” tem um sublot de um personagem transsexual que procura aceitação entre os Jets, a gangue dos rapazes brancos. No filme original, o personagem Anybody’s era só uma menina que se vestia de menino e que procurava se integrar à gangue. Por conta de ser uma menina masculinizada ela era ignorada e destratada.
No novo filme, Anybody’s recebe mais atenção do roteiro, sendo visto em diversos momentos tentando se integrar e até tendo mais importância no enredo como um todo. No fim ele é aceito como homem, mas em condições que normalmente seriam vistas como problemáticas. Por conta disso, é muito necessário pensar no contexto histórico de ser uma pessoa trans na mídia, e só nos últimos 10 ano que esse tipo de representatividade se tornou aceitável.
O belíssimo elenco
Honestamente, o elenco todo (com uma única exceção) está espetacular. A escolha corretíssima de usar atores jovens para os papeis já é um colossal contraste em relação ao filme original, o que ajuda demais na imersão da audiência. Além disso, todos cantam e dançam magnificamente, principalmente Anita (que estava no musical Hamilton) e Maria.
Antes de começar os múltiplos elogios, vamos à pedrinha no sapato de “Amor, Sublime Amor”. Ansel Elgort, o protagonista Tony, é definitivamente o único ponto fraco. Não que o rapaz atue mal, ele só é medíocre, no melhor sentido da palavra. O Spielberg consegue aproveitar demais a energia e bela voz do Elgort, mas ele não está no mesmo nível que o resto do elenco, pelo menos em termos de atuação.
Continuando, vamos falar de coisa boa, vamos falar da Rachel Zegler, a Maria. Essa menina tem uma voz absurda e já está escalada para ser a nova Branca de Neve. Afora essa promessa de uma carreira meteórica, Zegler entrega uma atuação que vai além de surpreender, ela passa por toda uma evolução de personagem que é realística e lindamente emocional. Do alto dos seus juvenis 20 aninhos, isso é mais do que um feito, é um dom.
O melhor
Agora, sem favoritismos, Ariana DeBose e David Alvarez são a melhor parte desse filme. Finalmente Anita e Bernardo, o casal mais animado, recebeu uma complexidade que é muito necessária. Além dos atores terem um baita química, ambos entregam uma personalidade forte e energética que complementa demais as duas personas. Além disso, eles são um casal com muito borogodó.
Afora os atores principais, e o casal favorito desse crítico, temos a volta da Rita Moreno, que está emocional numa personagem que não existia no filme original. Agora ela funciona como uma mãe/amiga/chefe para Tony, o que ajuda a mesclar os dois lados dessa guerra, e humaniza ainda mais toda essa situação. Também temos o resto as duas gangues, os dois policiais principais, as amigas da Anita e Maria, etc. São muitos personagens e extras, mas em nenhum momento a história fica confusa ou densa demais.
Os finalmentes
Por fim, Spielberg. Depois de 56 filmes e de uma carreira que marcou e mudou Hollywood, o diretor ainda tem energia e sagacidade para entregar um filme emocional, bonito, atual e importante. “Amor, Sublime Amor” é o filme que pode ajudar a movimentar a indústria para uma posição genuinamente mais diversa, plural e cheia de novos talentos de tudo quanto é lugar. Já se vão mais de 60 anos de carreira, e o cara não cansa. Spielberg lavou a égua.
Afinal, confira o trailer do filme:
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