A banda japonesa Boris acabou de lançar um novo álbum: “No” e é tudo que precisávamos. Apesar de não estar entre as bandas mais conhecidas do mundo, Boris com certeza é uma das melhores. Na ativa desde 1992 a banda não para nunca, quando acaba de gravar um disco já entra em turnê; e quando volta da turnê grava um novo álbum. Tem sido assim por quase trinta anos.
O trio principal, Wata, Atsuo e Takeshi está na banda desde o início. Mas já tiveram outros integrantes que transitaram pela banda, e volta e meia fazem colaborações com músicos do mundo todo. Falar deles é um pouco difícil, pois não se encaixam em nenhum estilo. E quando falo isso não é aquele típico clichê de diferentão, eles de fato não se encaixam em estilo nenhum, pois trocam a cada novo álbum. Esses álbuns já incluíram incursões pelo metal , música instrumental contemporânea, música experimental, punk, hardcore, psicodélico, drone, folk e todo tipo possível que lhes passe pela cabeça.
A instrumentalização também está em constante mudança, basicamente todos os três cantam e tocam diversos instrumentos, que vão dos tradicionais guitarra, bateria e baixo, mas passam por gongos, sintetizadores, percussões diversas e outras esquisitices eletrônicas…
Influências e Ativismos
Os três nunca esconderam suas influências. Por exemplo, o nome, retirado de uma música da banda Melvins (banda de Washington cultuada por Kurt Cobain, que chegou até a ser roadie dos caras). Logicamente, as influências continuam, My Bloody Valentine, banda cult de shoegaze; Merzbow, artista experimental japonês; Nick Drake, cantor folk americano dos anos 60, que o Boris faz referência na capa de “Akuma no Uta”, inclusive. Além de toda cena punk hardcore, que fica bem evidente em No.
O visual da banda Boris também segue todo um conceito que varia sempre que o som muda. Nunca estão parados ou satisfeitos com o que já foi feito.
Veganismo
Wata e Atsuo são veganos e buscam afirmar sempre que possível seus ideais em postagens nas redes sociais da banda. Preocupados sempre com direitos de animais e com questões ambientais. Ao concluírem as gravações do álbum, o anúncio foi feito em suas redes sociais juntamente com uma pequena reflexão sobre o momento que passamos. Falaram que é um momento de sentirmos, pensarmos e tomarmos decisões. Não nos comportarmos como os outros, e tomarmos nossas próprias ações. Que as pessoas estão acostumadas a inconscientemente adaptar-se a certas coisas e que tendem a ignorar inconvenientes, como se não estivessem lá.
O álbum começa com “Genesis”, a criação, faixa de 6 minutos que traz um pesado riff, bateria marcadamente lenta e prepara um clima para o disco que fica totalmente diferente à partir da segunda faixa, a já explosiva “anti-gone” que é uma espécie de single do disco e teve clipe musical dirigido pelo próprio Atsuo. O álbum segue bombástico com um hardcore japonês com pitadas de sludge e barreiras de efeitos de som. Em Zerkalo, a faixa 5, a velocidade diminui, e o peso aumenta com riffs pesados, microfonia e vocal desesperado por 5 minutos.
A faixa 9, “fundamental error” é na verdade um cover da banda de hardcore punk de Hiroshima: Gudon. “Loveless” merece destaque também, a música que tem o nome do consagrado disco da banda My Bloody Valentine, faz referência também nos efeitos distorcidos que criam impressão de sonho – ou pesadelo – porém, com velocidade e vocais agressivos. Ironicamente o álbum termina com a calma e contrastante faixa de nome “Interlude” que a guitarrista Wata canta suavemente.
Avant-garde Metal
“No” traz esse clima de resistência, de não aceitar o que te falam, porque você precisa pensar por si só. Como todos os álbuns anteriores da banda, o som é totalmente novo seguindo só o “lema” da banda “Stay Heavy”, mantendo o peso característico da suas músicas. À esse peso acrescenta-se pitadas de hardcore, de atitude punk e de ruídos típicos de uma banda de shoegaze dos anos 90. Assim se tem a receita de “No”, uma das melhores coisas que apareceram no ano de 2020, enquanto a pandemia Covid-19 torna o mundo mais difícil, e escancara vários problemas que estavam aí, mas as pessoas teimavam em não ver. E, infelizmente, ainda teimam, na verdade.
Por enquanto o álbum encontra-se disponível apenas no Bandcamp da banda para ouvir ou para compra. Contudo, os discos anteriores estão disponíveis nas plataformas de streaming. https://boris.bandcamp.com/album/no