“Tô Ryca! 2” é a celebração do estereótipo. A partir de um argumento reescreve “Até que a Sorte nos Separe 2” e “Até que a Sorte nos Separe 3”. Vemos a popular Selminha, Samanta Schmütz, caindo de volta na pobreza. Uma mulher com o mesmo nome, vivida por Evelyn Castro, aparece exigindo que toda a fortuna seja transferida para ela. No meio dessa treta toda, Selminha perde o namorado, a casa, o acesso à fortuna e tem que se acostumar novamente com a vida periférica vivendo de favor na casa da amiga.
Motivação, ou a falta dela
Infelizmente, “Tô Ryca! 2” é um filme que não faz muito sentido. O conflito do filme está claro no como ele ocorre, mas a motivação dos personagens, principalmente do advogado da Selminha, que não chega a explicar o motivo do seu golpe, está mais do que nebulosa. Além disso, essa aparente falta de intento se espalha para a forma como o diretor Pedro Antonio desenvolve a história. Os acontecimentos se seguem em forma de esquete, pouco conectados com o humor escrachado da protagonista.
Com uma atriz menos engraçada como estrela, “Tô Ryca! 2” seria completamente inassistível. As trapalhadas de Schmütz são constantes, e em alguns momentos realmente criminosas, o que nos leva a considerar que raio de pessoa ela se tornou quando recebeu a fortuna do parente distante. Com certeza, as tentativas sucessivas de homicídio são bizarras demais para ignorar apenas como outra esquete.
Além disso, observa-se uma caracterização estereotípica não só dos personagens pobres, mas também dos ricos. Faz sentido brincar com clichês numa comédia, mas isso faz com que “Tô Ryca! 2” fique mecânico e batido. Mesmo com o bom humor prevalecendo, falta um maior cuidado nas caracterizações, que são frequentemente bidimensionais.
A falta de senso
Além disso tudo, existe uma forçação de barra com a diversidade. Essa frase por si só é polêmica e errada, mas em “Tô Ryca! 2”, o diretor usa personagens LGBTQI+ e drag queens como tokens de diversidade. Em nenhum momento essas personagens são relevantes ou úteis ao plot além de servirem como a imagem de minorias no cinema. É importantíssimo ter representação no cinema nacional, mas não assim, não de forma gratuita e esvaziada da sua importância.
Não só com essa representação que “Tô Ryca! 2” peca. Como um todo, estamos no que parece ser o final de uma era de comédias “povão” que usam do subúrbio carioca como palco. O humorista Paulo Gustavo foi um dos campeões dessa geração de filmes, e com ele, vimos uma glorificação de um estilo de vida precário que é fetichizado para a massa classe média asséptica que vai ao cinema no shopping e compra pipoca cara.
Existe um desconforto palpável na imagem caricata do pobre na telona. Da kombi saindo da lotada, passando pela feijoada das escolas de samba até a clássica destruição com as chuvas de verão, todo o filme acompanha e faz troça do que é dia a dia de milhões de cariocas e brasileiros. Mesmo com várias piadinhas liberais que brincam com pensamentos socialistas e igualitários, no fim “Tô Ryca! 2” é uma piada com a cara das massas.
Finalização e finalmentes
Finalmente, “Tô Ryca! 2” não tem fim. O filme tem uma pseudofinalização que mais parece ser uma desculpa para Maiara e Maraisa darem um showzinho. Por mais que seja interessante para os fãs de sertanejo comercial, o filme realmente não acaba. Uma frase é dita, lágrimas correm e tudo acaba em festa, sem uma resolução franca nem uma catarse. Assim, fica difícil levar a sério um filme que parece ter sido gravado e escrito de forma corrida, por uma equipe que não compreende ou respeita a vida suburbana.
Aliás, se liga no trailer:
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