Tukum é um bando de criação. Entretanto, tucum também é uma palmeira comum da Amazônia. Essa árvore acabou virando um símbolo de amizade e lutas por libertação. E inspirou o nome desse grupo que une artes e valoriza a Arte. Formado por três amigos, o Tukum nasceu no litoral do estado de São Paulo formado pelos cariocas Bruno Olivieri e Luísa Pitta e o paranaense Flávio Cardoso. Bruno é músico, compositor, ator e palhaço, enquanto Flávio é cantor, ator e malabarista; já Luísa é cantora, atriz, bailarina e coreógrafa. Seus clipes e músicas são viagens nômades por um espaço artístico rico e bem brasileiro. Afinal, confira a entrevista que deram para a revista Vivente Andante:
Alvaro Tallarico: O grupo nasceu no estado de São Paulo, composto pelos cariocas Bruno Olivieri e Luísa Pitta e o paranaense Flávio Cardoso. Ou seja, bem Brasil, né? Como vocês se encontraram e reuniram nessa ideia?
Tukum: Somos atores, os três, e nos encontramos trabalhando em um projeto de teatro itinerante. A sede era no litoral de São Paulo, em Itanhaém. Eu (Luísa) e Bruno nos conhecemos no Rio e, fomos morar em São Paulo para trabalhar neste projeto, quando conhecemos o Flávio. Neste trabalho, que envolvia teatro e música, viajamos por muitos lugares do Brasil por dois anos. A estrada aproximou muito nós três, foram nascendo canções, invenções, melodias e quando vimos… tínhamos um primeiro disco autoral.
Alvaro Tallarico: Como é ser um cigano do espaço?
Tukum: É perceber o quanto somos pequenos diante da grandeza do Universo e se encantar com a beleza disso. É estar atento ao todo, esta constelação de poeririnhas de estrelas que são os seres que habitam este e outros planetas. Estar em movimento. Também é a consciência de que estamos todos interligados. É saber que nos separamos, mas voltamos a nos encontrar nos eternos ciclos da vida.
Portanto, olha o clipe da música que inspirou essa pergunta:
Alvaro Tallarico: Nos clipes e shows fica clara a influência do teatro e da dança. A ideia é fazer sempre essa mescla de artes mesmo?
Tukum: Somos intérpretes, criadores, gostamos de nos expressar de diversas formas. Como temos formação e passagem por mais de uma linguagem artística, queremos usar tudo o que nos é genuíno pra criar, abertos ao que vier.
Alvaro Tallarico: Como vocês fazem suas composições?
Tukum: Varia bastante. Nós três trabalhamos criando em uma complementariedade muito bonita e isso fluiu de maneira natural neste primeiro álbum. A maioria das músicas desta primeira obra vieram de letras ou propostas iniciais de letras que o Bruno trouxe e fomos desenvolvendo juntos, os três. As melodias eu e Flávio gostamos muito de nos debruçar, com a ajuda do Bruno. Algumas apenas Bruno e Flávio criaram, algumas apenas Bruno e eu. Algumas nós três criamos juntos. O Bruno, além das letras, cria os arranjos no violão. O processo é bastante fluido, intuitivo e, em jorro. Após as canções do álbum ‘22 dias a pé‘ muitas já estão nascendo.
Alvaro Tallarico: Coisa pouca, miúda, fagulha, grão. O que o ser humano precisa para evoluir?
Tukum: Quem somos nós na fila do pão pra dizer o que o ser humano precisa pra evoluir, né? Mas podemos palpitar, como coisa pouca, miúda, fagulha, grão que somos… Olhar pra dentro, se observar, se reinventar, se observar mais, desaprender um monte de porcarias que aprendemos… Olhar pra fora também… Observar o mundo, refletir sobre ele, pensar no outro, se importar com o outro, se envolver com o outro, se perceber parte do todo e agir para que o eu e o todo melhorem…
Alvaro Tallarico: A vida é vazia sem arte?
Tukum: É só fechar os olhos e imaginar um mundo sem música, teatro, dança, quadros, filmes… Só de imaginar, o vazio já se instaura.
Alvaro Tallarico: O que é arte?
Tukum: Muitas respostas possíveis borbulham… Sentimos que Arte é inventar e reinventar realidades. É olhar, escutar, perceber. Dar corpo às múltiplas falas que provoquem sensações diversas, que desloquem, questionem, façam suspirar e transformem o ser humano e as realidades existentes. Temos a palavra como uma das formas de expressão para o dia a dia, mas só ela não dá conta do universo complexo que somos.
Alvaro Tallarico: Quem é Luisa Pitta na fila do pão?
Tukum: Um ser vivente, caminhante, uma experimentadora da vida. Apaixonada pela arte e seu poder de emocionar, unir, transformar, mover dentro e fora. Apaixonada pelo humano e sua capacidade de criar beleza e luz mesmo sendo habitado também pelo caos e sombra. Aliás, a capacidade criativa humana me encanta. Sou uma buscadora…
Todavia, veja o clipe de “Máquina”:
Alvaro Tallarico: Quem é Bruno Olivieri na fila do pão?
Tukum: Alguém que observa o padeiro, dá bom dia pro moço da fila e talvez faça um poesia sobre isso. Alguém que gosta de comer o pão junto com o outro; que gosta de comer o pão devagar e sentir o gosto; que gosta muito de pão, mas se preocupa com o glúten; alguém que prefere o pão pra viagem. Alguém que imagina uma peça de teatro com o pão em cena, alguém que ficou pensando sobre quem era na fila do pão, que saiu pra padaria, mas esqueceu de comprar o…
Alvaro Tallarico: Quem é Flávio Cardoso na fila do pão?
Tukum: O que está sempre com fome, faminto de vida, de encontros, faminto de movimento. O que coleciona ralados e não machucados. Apaixonado pela troca dos seres, pela criação coletiva, pela troca genuína de compartilhar, ouvir, expor e sentir, e pelo leve gosto de, depois dos encontros, estar sozinho e sentir por dentro. Experimentar, trocar, compartilhar, brincar, estar presente é o que faz o seu monociclo percorrer caminhos criativos.
AT: Qual a importância da fé para vocês?
Tukum: Gil disse que ela “não costuma faiá”, e nós concordamos com ele… Ouvimos uma vez que “gente é pra brilhar, não pra morrer de fome”, Caetano cantou… Temos fé nisso também! Uma pitada de fé no “pessimismo da razão, otimismo da vontade” de Gramsci faz florescer ações urgentes para utopias possíveis!
AT: A resistência vem através da arte?
Tukum: A arte pode muito mais que resistir! A arte pode reinventar… propor outros mundos! A arte vai adiar o fim do mundo! Vai pintar os terra-planistas, negacionistas, anticientificistas e todos os obscurantistas! A arte acabou de beber um gole de utopias possíveis… nós brindamos!
AT: Entre choros e risadas, o que move o Tukum?
Tukum: O poder que nos movimenta é a arte do encontro, da partilha, das histórias e da conexão com o movimento natural, ou não, da vida. O prazer de caminhar e sentir por inteiro o que a caminhada nos trás com encontro, o respiro, o sorriso, a lagrima… a arte da pausa. A relação do plural com o único, as singularidades de um todo. Como diz Manoel de Barros em um dos trechos do poema “Tratado geral das grandezas do ínfimo” sobre o valor que temos diante nossas vidas e trajetórias: “Poderoso para mim não é aquele que descobre ouro. Para mim poderoso é aquele que descobre as insignificâncias (do mundo e as nossas)”. Por isso, procuramos a grandeza do afeto, do amor, do caos, da calma na criação de nossas canções e na continuação da nossa movimentação pelo mundo.
AT: Vocês são árvores sem raízes?
Tukum: Nenhuma árvore se sustenta sem raízes. Não estamos isolados, nunca. Fazemos parte de um todo. Muitos vieram antes de nós e muitos virão depois. As raízes que nos sustentam são nossas famílias, e temos muitas: as de sangue, que nos receberam nesse mundo e as famílias que construímos aqui, estas que, na caminhada, vão se encontrando, se aglutinando em projetos comuns. O coletivo é muito forte. O Tukum é puro coletivo. A principio, iniciou-se em três, contudo, nada teria caminhado se não fosse uma linda conexão de pessoas construindo junto, acreditando no projeto e somando forças dos mais variados tipos. Somos muitos.