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Cinema

Notas de Rebeldia e a dolorosa saudade de um pai | Crônica

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Notas de Rebeldia. Leia a crítica do filme da Netflix.

O filme Notas de Rebeldia começou me fazendo pensar sobre esse tal mundo do vinho, pois dá uma mostra do estudo necessário para entender a complexidade dessa bebida. Uma das provas para virar um sommelier é a desgustação às cegas. Ou seja, você dá aquela provada ali no vinho e tem que saber se é do Velho Mundo ou do Novo Mundo, se o aroma é frutado ou não, a uva, o ano, a acidez, e, em especial, a região. Admito que estou longe desse nível de sofisticação, sou daqueles que uma vez ou outra toma um vinho tinto, mas tenho alguma preferência, como Cabernet Sauvignon e Syrah. Inclusive, nem sei porque.

Além disso, temos aquele clássico embate entre pai e filho. O restaurante que era do avô e foi herdado pelo pai, o qual trabalha duro pela sua manutenção. Ele sonha que o filho siga o mesmo caminho e procura ensiná-lo e conduzi-lo, porém, Elijah (vivido por Mamoudou Athie) tem uma paixão crescente pelo vinho e quer ser um Master Sommelier. Fica claro que ele quer encontrar um caminho próprio, é uma busca por si, achar algo que realmente goste e impulsione sua vida. Quantas vezes os pais se esforçam para indicar um caminho, desejando o bem dos filhos?

Também tive muitas notas de rebeldia quando meu pai tentava me trazer para a realidade, enquanto insistia na minha ingenuidade e arrogância juvenil.

Naquela mesa

Em verdade, perto do fim do filme, lembrei do meu pai já falecido. Senti saudades e vontade de chorar. Uma ou duas lágrimas rolaram quando assistia pai e filho conversarem na tela. O esporte como possibilitador de assunto e conexões, a ajuda mútua, a amizade. É, faz falta ter meu velho ao meu lado ali, vendo um jogo qualquer de futebol. Qualquer não, certamente, seria um do Fluminense, time dele. Recordo de um jogo que fomos juntos no mais emblemático estádio do mundo, o Maracanã. Fluminense contra Santos, três a zero para o tricolor carioca. Meu pai evitava vibrar muito, mantinha o radinho de pilha no ouvido, com sua boina e aquela simplicidade que baseou meus valores para o resto da vida. Que saudade, pai.

Você nem ligava para beber, mas, vez ou outra, raramente, comprava uma garrafa de vinho no supermercado e tomava no almoço. Era para ser uma taça e virava a garrafa toda. Já ficava rindo mais, se soltava um pouco da sisudez. Que saudade, pai. Você sentado na mesa do almoço comendo batata doce. Hoje cozinhei batata doce pela primeira vez, ficou ótima, pai, queria que você pudesse provar. Agora estou chorando muito, não deu para conter, pai.

Quando estava adoecido, fiz sua barba. Raspei seu cabelo, máquina um. Você não gostava tão baixo, ficava mais parecido com seu irmão mais novo, Paulo, que usava mais dessa forma. Você era vaidoso, mesmo calvo, sempre ia no barbeiro cortar. Talvez fosse mais pelo ritual de ir e conversar com o barbeiro de tantos anos. Entretanto, a barba mesmo fazia sempre em casa, talvez lembrando dos anos que serviu como fuzileiro naval. É uma das cenas mais fixas na minha mente, seu rosto com espuma de barbear. Eu prefiro manter a barba. Quando faço a barba e passo a máquina um, olho no espelho e vejo você. Mas ainda falta muito para eu chegar em tão alto patamar.

Sendo assim, se é para liberar os rios nos seios da face e recordar a sua luz, só ouvindo Nelson Gonçalves cantar “Naquela Mesa”:

Afinal, veja o trailer legendado de “Notas de Rebeldia”:

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‘Névoa prateada’, de Sacha Polak, é filme para refletir | Crítica

O longa estreia no dia 18 de abril nos cinemas de Brasília e São Paulo.

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nevoa prateada

Névoa prateada é um filme arrebatador que, com certeza, não vai passar incólume. O longa propicia emoções intensas, sejam elas positivas ou negativas. Fato que muitos não irão gostar. Alguns podem considerá-lo extremo demais, pesado demais. Os espectadores acostumados a tratar o cinema somente como forma de entretenimento e diversão provavelmente não irão gostar, já que é um filme que propõe análise e questionamentos. E que retrata uma realidade comum em alguns lugares da Inglaterra – e também de outros locais. Contudo, para quem gosta de assistir filmes que criticam a sociedade e comportamentos é um prato cheio. E para quem pretende aprender com o audiovisual também.

Mas sobre o que fala Névoa prateada?

A protagonista do filme é Franky, uma enfermeira de 23 anos que vive com a família em um bairro no leste de Londres. Obcecada por vingança e com a necessidade de encontrar culpados por um acidente traumático ocorrido há 15 anos, ela é incapaz de se envolver em um relacionamento com alguma profundidade. Até que se apaixona por Florence, uma de suas pacientes. As duas fogem para o litoral, onde Florence mora com a família. Lá, Franky encontrará o refúgio emocional para lidar com as questões do passado.

A saber, a atriz Vicky Knight, intérprete de Franky, venceu o Prêmio do Júri do Teddy Award do Festival de Berlim. Além disso, o longa recebeu indicação de Melhor Filme no Panorama Audience Award e foi destaque na programação da 47ª Mostra Internacional de Cinema em São PauloParticipou, também, dos prêmios Dinard British Film Festival (vencedor como melhor filme), Tribeca Film Festival (indicado ao Best International Narrative Feature), FilmOut San Diego US, Sunny Bunny LGBTQIA+ Film Festival, entre outros.

Vicky Knight
A atriz Vicky Knight, protagonista do longa. Foto: Divulgação.

A diretora de Névoa prateada, Sacha Polak, costuma levar para filmes temas difíceis, que poderiam facilmente ser assunto de terapia. A necessidade de se sentir amada, preconceitos, dificuldade de esquecer uma situação, aceitação. No longa em questão, Sacha trata de vários assuntos, como autoaceitação e, também, dificuldade de perdoar. Porém, apesar de ter uma gama de temas, o filme não se torna cansativo ou confuso. Muito pelo contrário, o roteiro passa para o espectador muito bem todos os conflitos da protagonista.

Além disso, Franky não é apresentada de forma piegas ou clichê. Por ter sido vítima de um incêndio, a personagem tem marcas em sua pele que poderiam, em uma narrativa mais lugar comum, transformá-la em uma pessoa que se vitimiza ou que é vista como coitadinha o tempo todo pelos outros. Mas não é isso que Sacha quer passar para quem assiste. E, apesar de não ter uma vida fácil, é possível enxergar Franky para além de suas cicatrizes. Franky é uma personagem complexa, completa e muito bem desenvolvida, tanto pelo roteiro quanto por sua intérprete.

Talvez por já ter trabalhado com Sacha Polak anteriormente, Vicky Knight tem facilidade em transpor para a tela os conflitos internos de Franky sem deixá-la simples demais ou transformá-la em um mártir. Também ajuda ter passado por situações parecidas com as da personagem. O fato é que foi justo o prêmio Teddy Awards que Vicky recebeu, já que consegue trabalhar nos detalhes, algo que nem todo ator tem sucesso.

Fotografia

Apesar de ser um recurso bastante comum, não deixa de ser interessante ver o filme em cores mais frias, já que Franky não tem uma vida fácil e passa por conflitos internos durante todo o filme. Também é possível que tal característica seja por ter sido filmado na Inglaterra, onde não há mesmo muito sol. Todavia, fica claro que Sacha Polak – e também a fotografia de Tibor Dingelstad – quis expressar o interior de Vicky nas cores frias que vemos nas cenas.

Além disso, a escolha de planos abertos quando Vicky se encontra perdida em sua vida e planos mais fechados quando ela começa a se encontrar ajudam a contar a história da protagonista. E, também, de sua coadjuvante, Florence. Aliás, Esme Creed-Miles arrasa na interpretação da menina totalmente sem rumo e influenciável. Se há algo negativo nesse filme é que Florence poderia ter tido mais espaço. E também, talvez, poderia ter havido mais cenas de Franky e Alice. Vicky Knight e Angela Bruce têm uma química muito boa em tela e poderia ter sido mais explorada.

Angela e Vicky
Angela Bruce e Vicky Knight. Foto: Divulgação.

Para resumir, é um filme bastante introspectivo, bonito e reflexivo, que mostra, de forma original, o valor das pessoas que nos rodeiam. Névoa prateada estreia no dia 18 de abril nos cinemas de Brasília e São Paulo.

Por fim, fique com o trailer:

Ficha Técnica

NÉVOA PRATEADA (Silver Haze)

Holanda, Reino Unido | 2023 | 1h42min. | Drama

Direção e roteiro: Sacha Polak.

Elenco: Vicky Knight, Esme Creed-Miles, Archie Brigden, Angela Bruce, Brandon Bendell, Carrie Bunyan, Alfie Deegan, Sarah-Jane Dent.

Produção: Viking Films.

Distribuição: Bitelli Films.

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