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Oscar | ‘1917’ é Sam Mendes brilhando sob a luz de Roger Deakins

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Saiba mais sobre o filme 1917.

1917 é um filmaço. Não, o roteiro não é genial – longe disso – contudo, funciona perfeitamente e é a base para, em uma estória simples, o diretor Sam Mendes mostrar todo seu poder de condução. Aliás, dessa vez, usa e abusa de planos-sequência, fazendo parecer que foi tudo filmado em uma só tomada. Mendes consegue manter o espectador ligado o tempo inteiro, dentro da ação, dos perigos, da guerra. Ainda temos uma fotografia lindíssima de Roger Deakins. Não por acaso, ganhou o BAFTA (Oscar britânico) de Melhor Fotografia, além de Melhor Filme e, claro, Melhor Diretor.

Como comentado, a estória é simples, e, de certa forma, lembra outro ótimo filme de guerra “O Resgate do Soldado Ryan” (Saving Private Ryan, 1998). Nesse vencedor do Oscar de Melhor Filme, de Steven Spielberg, há encarregados de uma missão difícil em meio a uma guerra cruel. Bem parecido com 1917. Durante a exibição vemos um pouco dos horrores dessa atrocidade entre seres humanos. Temos cenas que brincam com o foco e onde as luzes são personagens, criando a sensação constante de perigo iminente.

Vemos saltos para o nada que encontram a salvação – ou a morte certa. Pode-se dizer que Sam Mendes aproveita para fazer um show off, ou seja, realmente deixar claro que sabe dirigir um filme. Ele já fez o roteiro para focar em ser um grande plano-sequência com um esmero impressionante. Logo de início já seguimos junto com os dois cabos pela trincheira. É Sam Mendes dizendo que não está para brincadeira.

Clichê sim, Arte também

A sinopse de 1917 ? Na Primeira Guerra Mundial, dois soldados britânicos recebem uma ordem que parece impossível. Eles precisam atravessar o território inimigo e entregar uma mensagem que pode salvar 1600 de seus companheiros. Aí está, bem simples, entretanto, os vários planos sequência, e os espetaculares efeitos visuais são excelentes. Quando os dois atravessam a área devastada entre arames, poças, ratos e corpos, ali estamos juntos com eles, e é incrível. Pode até ter cara de videogame, até pela falta de um roteiro profundo, pois os protagonistas seguem como em um jogo por entre cenários e fases.

A determinação do soldado em busca de concretizar a missão, seu olhar que às vezes se perde, o caminhar cambaleante, a corrida pela vida… São cenas e cores que se sobressaem. Mais uma vez, devo citar a fabulosa direção de fotografia de Roger Deakins.  Ele começou a chamar mais atenção quando filmou o belo “Um Sonho de Liberdade” (The Shawshank Redemption, 1994) para o diretor Frank Darabont, quando teve sua primeira indicação ao Oscar. Posteriormente, teve uma parceria com os irmãos Joel e Ethan Coen, Sam Mendes e, mais recentemente, com Denis Villeneuve. A cena em que o soldado Schofield vai em direção a ruínas em chamas, enquanto é emoldurado pela luz, com um chafariz que vira símbolo religioso, é arte em movimento.

É clichê o fato de ser mais um filme de guerra sobre uma missão complicada, e a cena final não emociona como poderia, entretanto, a forma como foi realizado, a cinematografia caprichada, os planos e tomadas que seguram e levam o espectador, fazem toda a diferença e permitem a imersão naquele mundo. O mergulho na sétima arte.

Para você ter uma noção do trabalho maravilhoso da direção de fotografia, veja isso:

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Cinema

‘Transe’ | Crítica

Longa brasileiro estreia na próxima quinta-feira, 02 de maio de 2024, com debate após sessão no Estação Net Gávea.

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Transe.

Em outubro de 2022, quando assisti Transe no Festival do Rio, escrevi: “Eu gostaria que “Transe” estreasse nas telas de cinema agora, antes do dia 30 de outubro. Eu gostaria que fosse lançado pra ver se alguém acorda ouvindo os discursos proferidos por Bolsonaro que estão no filme. Talvez seja ingênuo da minha parte achar que depois de quatro anos de tanto terror e um país tão mal governado, um filme vá fazer alguém acordar. Mas eu tenho esperança. Eu acredito no poder de mudança da arte. Acredito que, às vezes, uma coisa dita de outra forma, algo escancarado numa tela de cinema imensa possa fazer alguém enxergar os fatos que estão óbvios nas caras das pessoas e elas não veem. Sei lá, sou otimista (ou só assim pra eu não perder de vez a esperança na humanidade).”

Parece que Matheus Macena, que está no elenco do filme, concorda em parte comigo. Ele disse, em coletiva de imprensa que aconteceu no dia 29 de abril de 2024, que “o cinema tem poder”. O mais curioso é que essa sua fala veio como resposta de uma pergunta que eu fiz aos presentes: Anne Pinheiro Guimarães e Carolina Jabor, as diretoras de Transe, Luísa Arraes, Johnny Massaro, Ravel Andrade e o próprio Matheus, parte do elenco do longa.

A pergunta era: “Vocês acreditam que é possível o filme atingir alguém de fora da bolha?”. A resposta que mais gostei, além da de Matheus, foi a de Ravel Andrade. Ele disse que mais do que tocar pessoas que estão fora da bolha retratada no longa, o intuito é fazer as pessoas da bolha olharem para fora dela. Achei interessante porque, de fato, só há possibilidade de mudança quando os opostos conseguem, no mínimo, conversar.

Coletiva de imprensa virtual de "Transe".
Coletiva de imprensa virtual de “Transe”.

Mas sobre o que, afinal, é Transe?

Transe é um filme de ficção documental. Ou um documentário ficcional. Isso porque desde o princípio se propôs a não ser algo fechado. As diretoras Anne Pinheiro Guimarães e Carolina Jabor, em parceria com Luísa Arraes, que também é co-roteirista do filme, queriam documentar o processo das eleições de 2018. Mas não a parte política em si, mostrando os presidenciáveis em campanha em tal, e sim o que a eleição estava gerando na população.

Segundo a própria Anne, “o filme surgiu de uma angústia coletiva, um despertar para a política”. Contudo, não traz respostas, e sim, mostra a realidade de uma parte – muito privilegiada e nichada – da população. Nele, assistimos jovens de classe média que, em sua maioria, estava começando a entender e se interessar por política naquela época, muito devido aos caos existente e ao desespero causado por uma iminente vitória de um candidato de extrema-direita. Que, infelizmente, veio a vencer a eleição.

Acompanhamos conversas entre esses personagens, que não sabemos se são roteirizadas ou são pensamentos dos próprios atores, já que os personagens têm seus nomes. Spoiler: muito pouco do longa foi roteirizado. As situações foram acontecendo e o roteiro foi sendo escrito à medida em que as filmagens aconteciam. Não é possível, por exemplo, saber o que pode acontecer durante uma manifestação real, que aconteceu e foi documentada no longa. Por isso, aliás, podemos entender o filme também como um documentário.

Luisa e Johnny
Luísa Arraes e Johnny Massaro após manifestação. Imagem: Divulgação.

Trisal em transe

No meio de toda essa situação política, confusa e importante, há o trisal do filme: Luísa, Ravel e Johnny. De início, seria somente um casal. Mas, como já mencionado, o filme foi sendo escrito enquanto era gravado e surgiu Johnny no meio disso tudo. Não, não era um trisal verdadeiro. Mas Johnny encontrou Luísa no meio de uma festa que estava sendo gravada para o longa, deu um beijo (para o filme) na personagem (ou na atriz) e pouco depois seria convidado a integrar Transe.

Ravel Andrade, Luísa Arraes e Johnny Massaro.
Ravel Andrade, Luísa Arraes e Johnny Massaro. Imagem: Divulgação.

O trisal tornou a trama muito mais interessante. Assistir como cada personagem lida com os acontecimentos intriga. Faz voltar àquela época e indagar com quem você se parecia mais. É instigante, também, pensar que a relação entre aquelas três pessoas poderia ser diferente se fosse em outra época, com menos questionamentos e incertezas. O que faz o espectador analisar o impacto do meio em suas relações.

Além disso, era uma época em que os padrões relacionais estavam começando a modificar. Hoje já é comum (mais uma vez, em certas bolhas), porém, em 2018, o amor livre não era algo tão comentado ou até exercido. E essa experimentação do trisal, que sai de um casal para um trio, personifica as modificações da sociedade. Segundo Anne Pinheiro Guimarães, “o título do filme caiu como uma luva. O Brasil estava em transe (por conta das eleições), os três também estavam em transe”, disse na coletiva de imprensa. Luísa Arraes complementou dizendo que foi uma época de muitas fake news e que o Brasil ainda não tinha muito conhecimento disso. Portanto, o transe em que Brasil se encontrava era, ademais, por conta dessas falsas verdades também.

Luísa Arraes em cena.
Luísa Arraes em cena. Imagem: Divulgação.

Esperança

Na realidade, Transe é um espelho do que foi 2018 para a esquerda, principalmente a esquerda chamada festiva, que não estava entendendo muito bem a força que o antigo presidente tinha no Brasil. Porque o filme mostra, de maneira bem realista, a esquerda (essa parte da esquerda) se dando conta, aos poucos, que ele podia, sim, ganhar. Mostra jovens utópicos que achavam que seria impossível ter alguém como ele na presidência, que óbvio que o povo brasileiro nunca o elegeria, e aos poucos percebendo que seria, sim, possível que acontecesse. E perdendo, também aos poucos, a esperança e a alegria. Fez essa parte da população perceber que era preciso mesmo sair de sua bolha para entender que nada seria possível sem entender “o outro lado”. Por isso a fala de Ravel, lá no começo dessa crítica.

Como dito por Anne Guimarães, não é um filme para encontrar respostas. É um filme muito bonito (esteticamente) feito para fazer com que as pessoas parem e pensem se a maneira com que estão lidando com a vida é útil. Útil no sentido de fazer sentido para todos. De analisar se a mudança, se é que esse seja o intuito, vai acontecer se as ações continuarem do mesmo jeito.

Eu, pessoalmente, acredito na fala do Matheus lá de cima: o cinema – e todas as artes – têm poder.

Sessão de estreia com debate

Transe entra em cartaz nas salas de cinema de todo o Brasil no dia 02 de maio, próxima quinta-feira. No mesmo dia, no Estação Net Gávea, ocorre uma sessão especial, com venda de ingressos para o público. O evento contará com a presença das diretoras, Anne Pinheiro Guimarães e Carolian Jabor, e do elenco. Além das diretoras e dos três protagonistas, o ator Matheus Macena, que interpreta o personagem João, e convidados especiais, como Polly Marinho, Mauro Lima, Alinne Moraes, Suzy Lopes, Stella Rabello, Eloisa Yamashita, Flora Camolese, João Vitor Silva e a vereadora Tainá de Paula também estão confirmados no evento.

A sessão terá início às 21h e o debate sobre o filme ocorre logo após o término. O Estação Net Gávea fica no Shopping da Gávea. O endereço é Rua Marquês de São Vicente, 52.

Por enquanto, fique com o trailer:

Por fim, leia também a crítica de Diogo Vianna sobre o filme, escrita em 2022. E outras críticas de outros filmes brasileiros tão bons quanto Transe:

Transe | Filme é uma viagem ao centro da bolha

Crítica ‘Tia Virgínia’ | Treta familiar em um filme excelente

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